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Por um polo independente da classe trabalhadora 

Desafios da atual conjuntura 

Março de 2016 

A reeleição de Dilma em 2014 foi muito apertada, 
na realidade foi a eleição presidencial mais apertada que 
0 país teve desde 0 fim da última ditadura. Ao longo de 
suas três gestões anteriores, em particular 0 primeiro 
mandato de Dilma, 0 PT sofreu um desgaste muito grande, 
especialmente entre os extratos médios da sociedade. 

Ao mesmo tempo, sua base histórica - os trabalhadores 
organizados do movimento sindical e popular - se 
distanciaram cada vez mais do partido. A nova base que 
0 manteve no poder nesses últimos anos - os setores 
altamente precarizados da classe trabalhadora - começou 
em 2013 a demonstrar crescente descontentamento e se 
distanciou do PT nas umas. Sintoma dessa erosão da sua 
base política, 0 PT perdeu umas até mesmo em alguns de 
seus mais antigos bastiões na periferia paulista e no cordão 
industrial de SP. O governo também não recebe mais 0 
apoio de setores importantes da burguesia nacional, que 
exigem um ritmo cada vez mais rápido de medidas contra 
a classe trabalhadora e 0 povo para que a conta da recessão 
caia sobre nós. 

Diante de todo 0 tumulto político do ano passado, 


Dilma e sua cúpula fizeram 0 exato oposto do que haviam 
prometido às massas durante 0 segundo turno das eleições 
e aplicaram quase que literalmente 0 programa de seu 
adversário, Aécio Neves/PSDB, em uma clara opção 
pelos interesses da burguesia em detrimento daqueles que 
depositaram (equivocadamente) sua confiança nela. Essa 
mostra de “boa fé” chegou até mesmo ao ponto de dar 0 
comando do Ministério da Fazenda (historicamente um 
posto ocupado por economistas inteiramente alinhados 
ao suposto “neodesenvolvimentismo” petista) a ninguém 
menos que um Chicago boy seguidor estrito da cartilha 
neoliberal, Joaquim Levy. 

De mãos dadas a Levy, Dilma lançou um verdadeiro 
rolo compressor sobre os direitos e condições de vida dos 
trabalhadores, tais como 0 PL das terceirizações (que cria 
brechas na CLT), os pesados cortes na saúde e educação 
públicas e a lei “antiterrorismo”. E para os inocentes ou 
hipócritas que acharam que a culpa era apenas de Levy (como 
se isso fosse possível), 0 novo Ministro da Fazenda, Nelson 
Barbosa - que reestabelece a ligação histórica da pasta ao 
ideal “neodesenvolvimentista” - já anunciou um ataque à 







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previdência para 2016, dentre outros que Dilma planeja. 

O acúmulo desses fenômenos ocorre conjuntamente 
aos efeitos da segunda fase econômica derivada da crise 
de 2008 (o esgotamento das contas públicas, torradas para 
salvar empresas falidas ou em dificuldades) e do começo 
de um novo ciclo de recessão, dessa vez combinado 
com inflação crescente. Isso abriu uma nova situação 
política no país, na qual há espaço para a construção de 
alternativas à hegemonia petista que predominou na última 
década e meia. Todavia, esse espaço tem sido ocupado 
até o momento, não por forças da classe trabalhadora 
organizada, mas por demagogos que parasitam a máquina 
estatal (como a “Bancada do Boi, da Bala e da Bíblia” na 
Câmara) e por uma “nova” direita, que deu as caras ao 
longo do ano passado. 

Esses dois grupos de atores políticos tem conseguido 
(ao menos até o momento) pautar uma alternativa 
extremamenteconservadoraaopetismo.Dentreoutrascoisas, 
essas forças demonizam o comunismo e os movimentos 
sociais (esdruxulamente igualados ao PT) e se apresentam 
enquanto representantes dos valores “tradicionais” e da 
“família brasileira” - uma verdadeira onda conservadora, 
como tem sido caracterizada por alguns. Essa tendência 
começou a ganhar força de verdade no primeiro semestre 
de 2015, na forma de um “terceiro turno” das referidas 
eleições apertadas, quando setores da oposição burguesa ao 
governo se unificaram na convocação de protestos de rua 
e em um constante ataque público ao PT e à presidência, 
simbolizado nos esdrúxulos “panelaços” da classe média 
conservadora ante aparições de Dilma na televisão. 

Uma “nova” direita para velhos interesses 

O primeiro fenômeno a desafiar a esquerda em 
2015 foi a tomada das ruas pela direita. Em março e 
em abril, centenas de milhares de pessoas foram às ruas 
nas principais capitais do país em protestos dominicais 
com camisa verde-amarela, bandeiras do Brasil e outros 
apetrechos, dançando, fazendo coreografias e tirando 
“selfies” com PMs. Foi a primeira vez em muitos anos em 
que a direita foi capaz de tomar as ruas em nosso país, 
alcançando números significativos em várias cidades, 
especialmente São Paulo. 

Osmanifestantesapontavamcomoprincipaldemanda 
o “fim da corrupção”, que era identificada exclusivamente 
com o PT (como se Cunha, PSDB, DEM e o restante da 
corja capitalista não fossem também corruptos). Muitos 
chamavam também pelo impeachmentáa presidente. Em 
praticamente todas as capitais, alguns setores dos protestos 
chamavam por uma “intervenção militar” contra o governo 
e faziam apologia aberta da ditadura militar brasileira 
(1964-85). Foram recorrentes as manifestações de ódio ao 
“comunismo” que supostamente o PT quer introduzir no 
país, de acordo teorias da conspiração que tem circulado 
na internet. Em Jundiaí, a sede do PT sofreu uma tentativa 
de incêndio criminoso. No Rio de Janeiro e em outros 
lugares, pessoas vestindo camisas vermelhas (mesmo sem 
qualquer relação com a esquerda) foram hostilizadas. 


As grandes redes de comunicação, destacando- 
se a Rede Globo, cobriram amplamente esses primeiros 
protestos, com flashes ao vivo durante todo o dia, 
estimulando a população a participar dos atos. Uma postura 
bem diferente das alcunhas de “vândalos” e “desordeiros” 
que “atrapalham o trânsito” que geralmente essa emissora 
usa para qualificar as manifestações dos movimentos 
sociais e da esquerda. Cobertura semelhante foi dada aos 
“panelaços”, através da reprodução de vídeos amadores e 
da criação de mapas que mostravam sua ocorrência país 
afora toda vez que Dilma fazia algum pronunciamento na 
TV. 

Alguns institutos de pesquisa traçaram um perfil dos 
participantes dessas manifestações de março e abril. O que 
podemos observar é que se trata de uma maioria branca, 
de classe média alta. Em São Paulo, 41% ganhavam mais 
de 10 salários-mínimos (sendo que mais 27% ganhavam 
entre 5 e 10 salários). Em Porto Alegre, a proporção 
foi parecida. [ 1 ] O que isso demonstra é que o público 
principal desses protestos não foi da classe trabalhadora, 
embora certamente houvesse muitos trabalhadores 
iludidos ou reacionários entre os presentes. Mas o caráter 
dominante foi de pequenos burgueses, burgueses e setores 
aristocráticos da sociedade, que tem razões sociais distintas 
para sua insatisfação com o governo Dilma, que nada tem 
a ver com as dos trabalhadores. Não à toa, pouco se ouviu 
falar nesses dias sobre os cortes nas áreas sociais, sobre 
a redução de direitos trabalhistas ou sobre o desemprego. 
Tais protestos se configuraram como pontos de encontro 
dos setores mais reacionários da política brasileira. Os 
principais organizadores foram o Movimento Vem Pra 
Rua, o Movimento Brasil Livre e o grupo “Revoltados 
Online”. 

O Vem Pra Rua é considerado o mais “moderado” 
desses grupos direitistas e o que reuniu maiores contingentes 
ao redor de si durante as manifestações. Seu principal líder 
é um empresário e sócio de uma grande gestora de fundos 
de investimento, Rogério Chequer. Ele apoiou Aécio 
Neves do PSDB nas eleições de 2014 e não escondia sua 
preferência política pessoal, ao mesmo tempo em que 
afirmava o caráter “apartidário” do movimento e negava 

índice 

Os desafios da atual conjuntura [p. oi] 

A agenda de ataques do governo Dilma [p. n] 

Os vaivéns centristas do MRT / FT-QI [p. 15] 

Polêmica com PSTU / LIT-CI sobre a Palestina [p. 20] 
Panfleto da luta dos servidores estaduais do RJ [p. 26] 
Guerra civil síria, Estado Islâmico e a batalha por [p. 34 ] 
Kobane 

Reagrupamento Revolucionário 

Site: rr4i.org 

Email: reagrupamento.revolucionario@gmail.com 
Caixa Postal: 50048, RJ, CEP 20050-971 


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qualquer tipo de financiamento empresarial. Apesar do 
suposto apartidarismo, o Vem Pra Rua estava claramente 
alinhado ao PSDB, cuja ala majoritária (representada por 
Serra, Alckmin e FHC) vinha à época se posicionando 
contra chamar por um impeachment. [2] [3] 

Por sua vez, o grupo “Revoltados Online” é 
formado por cerca de 20 colaboradores de uma página nas 
redes sociais. Eles defendem ardorosamente o impeachment 
e muitas vezes fizeram postagens a favor da intervenção 
militar. São propagadores das teorias conspiratórias sobre 
os planos “comunistas” do PT (ignorando toda a política 
neoliberal levada adiante por Dilma) e elogiam Jair 
Bolsonaro, o deputado pró-ditadura e inimigo dos direitos 
democráticos das mulheres e LGBT. Ademais, venderam 
kits “anti-Dilma”, os quais incluíam (a preços exorbitantes) 
camisas, adesivos e cometas - fazendo o grupo parecer 
mais uma empresa oportunista do que uma organização 
política. [ 2 ] 

Já o Movimento Brasil Livre (MBL) é algo 
realmente “novo”, em certo sentido. Chama atenção 
em primeiro lugar o fato de suas figuras públicas serem 
todas pessoas de 20 e poucos anos e de muitas delas não 
serem defensoras do neoliberalismo “tradicional”, mas 
sim “libertárias” - isto é, contra toda e qualquer forma 
de intervenção estatal na economia, mesmo que seja para 
salvar empresas em falência, financiar determinados 
empreendimentos ou mesmo mitigar a desigualdade social 
em benefício do capital (cabe lembrar que mesmo Bolsa 
Família é inspirado nas ideias de “renda mínima” do guru 
neoliberal Milton Friedman e aprovado pelo FMI). A ala 
“libertária” do MBL, inspirada nas ideias de Ludwig von 
Mises - representante da chamada “Escola Austríaca” - 
defende um utópico capitalismo sem Estado (alguns chegam 
ao extremo de se reivindicarem “anarcocapitalistas”). 
Agem como se o Estado fosse um ente autônomo que caiu 
do céu e acabou com o capitalismo livre concorrencial, e 
não um instrumento do capital desde suas origens, sendo 
sua atual “interferência” na economia algo feito para e 
pelos grandes monopólios surgidos da dinâmica de crises 
sistêmicas do capitalismo. [2] [4] 

Nesse sentido, se o neoliberalismo é o programa 
do grande capital para a atual etapa da decadência 
imperialista, o “libertarianismo” é a utópica resposta 
dos setores inferiores do empresariado, especialmente os 
“empreendedores” à constante ameaça de serem tirados de 
jogo por competidores que tem amplos recursos estatais 
a seu dispor. Todavia, apesar de soar “nova”, essa direita 
aglutinada no MBL foi gestada por atores sociais cujos 
interesses são muito velhos. Seus líderes são ligados a 
grupos de elaboração estratégica da direita ( think tanks). 


O 


nutti 



VemPraRua.net 


O MBL, Revoltados Online e Vem Pra Rua, grupos que tomaram a 
frente das manifestações da direita, são ligados a fundações em- 
presariais, partidos da ordem e/ou pequenos empresários. 


como o Instituto Liberal e Estudantes pela Liberdade, 
e estes são todos financiados por centros da direita 
americana, por sua vez mantidos com vultuosos recursos 
de grandes empresas. Como foi demonstrado no apoio da 
FIESP às manifestações de março e abril, até mesmo esses 
jovens utópicos com instintos reacionários podem servir 
como peões no tabuleiro do grande capital. [2] [4] 

Graças às manifestações puxadas por esses grupos, 
durante certo momento do ano passado a oposição burguesa 
ao governo do PT teve uma chance real de conseguir colocá- 
lo em xeque. Todavia, as divisões internas fizeram com 
que ela perdesse tal chance, especialmente por conta da ala 
majoritária do PSDB ter preferido esperar até o pleito de 
2018, para enfrentar nas umas um PT enfraquecido. Nas 
palavras de Aloysio Nunes, senador do PSDB, o plano 
é fazer o partido da situação “sangrar” até as próximas 
eleições nacionais [4]. Não obstante a falta de firmeza em 
relação ao impeachment nessa época, as manifestações 
- somadas à falta de popularidade do PT e seu isolamento 
na Câmara - fizeram com que Dilma cedesse ainda mais 
aos interesses do grande capital, em detrimento dos 
trabalhadores. 

Mas, ainda que o PSDB tenha preferido usar as 
mas como mero instrumento de pressão para sua política 
feita por dentro da “institucionalidade”, parte dos grupos 
que organizaram as manifestações seguem firmes em seu 
desejo de ver Dilma cair, e seguem convocando protestos 
de tempos em tempos. Estes têm estado menores, agora 
que perderam o apoio direto de setores do grande capital 
e de seus representantes políticos, todos apostando nas 
brigas palacianas, especialmente depois que o pedido de 
impeachment contra Dilma foi aceito pelo legislativo. 

Boicotar e denunciar as manifestações direitistas 

Após o fracasso daquelas convocadas no segundo 
semestre de 2015, o MLB, Vem Pra Rua etc. fizeram uma 
igualmente fracassada manifestação nacional em Brasília 
e estão desde então acampados no Planalto Central, com 
números irrisórios, sendo que seus representantes públicos 
e ideólogos tem se engalfinhado em polêmicas cada vez 
mais agudas [5]. Esse quadro só começou a mudar agora 
no começo de março, com a nova instabilidade criada pelo 
fechamento do cerco da Operação Lava Jato sobre Dilma 
e Lula, tendo a manifestação do dia 13 superado um pouco 
os números daquela de 15 março de 2015. É provável que 
novas manifestações continuem sendo convocadas como 
forma de pressionar pelo impeachment. 

Em primeiro lugar, é necessário denunciar como 
direitistas e incentivar os trabalhadores a boicotar essas 
manifestações. Por mais óbvio que possa parecer, é preciso 
dizer que essas manifestações não são “movimentos de 
massas” com demandas populares, mas marchas articuladas 
pela direita, cujo objetivo último é aprofundar a onda de 
ataques contra a classe trabalhadora. Apesar da aparente 
obviedade disso, alguns grupos da esquerda - o MNN / 
Território Livre, o MRS (Movimento Revolucionário 



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Socialista) e os maoístas organizados em tomo do jornal A 
Nova Democracia, foram nas primeiras manifestações, de 
maior volume, e consideraram-nas lutas legítimas contra o 
governo Dilma. Agora em 2016, apenas o MRS continua 
a insistir em tal tática, ao passo que os demais a tem 
evitado. [6] 

Essas posições absurdas, que não se importam 
em estabelecer uma “frente única” com direita contra 
o governo, devem ser repudiadas. Tomando as bases, 
as lideranças e o programa dessas manifestações, elas 
representam interesses completamente alheios e, de fato, 
opostos aos da classe trabalhadora e é uma ilusão fatal 
achar que é possível disputá-las. É inclusive surpreendente 
que os membros dessas organizações não tenham sido 
linchados, uma vez que uma simples camiseta vermelha 
muitas vezes já era suficiente para despertar a fúria dos mais 
fanáticos direitistas. Não à toa, esses “revolucionários” 
omitiram qualquer referência ao comunismo em seus 
materiais e vestimentas ao engrossarem as fileiras de tais 
manifestações. 

A disputa intraburguesa muda de terreno: o 

impeachment 

Foi também nessa situação de instabilidade que 
emergiu a figura de Eduardo Cunha na Presidência na 
Câmara, um demagogo membro da Bancada Evangélica, 
perito em manobras estatutárias e aliado aos sanguessugas 
descontentes da Câmara. Se aproveitando de seu 
poder momentâneo, Cunha e seus aliados da “Bancada 
BBB” encaminharam uma série de projetos que foram 
devidamente chamados de “pauta conservadora”. Dentre 
tais projetos, que incluíam um “Estatuto da Família” 
(contra a definição de casais homoafetivos como família), 
um “Estatuto do Desarmamento”, um “Dia do Orgulho 
Hétero” e um em particular que gerou forte reação, o de 
restringir o uso de contraceptivos abortivos por mulheres 
vítimas de estupro. Este último, encaminhado já em um 
momento de fragilidade de Cunha, por ter sido exposto 
na Operação Lava Jato, foi respondido com numerosas 
passeatas e atos públicos em capitais como Rio de Janeiro 
e São Paulo, protagonizadas por mulheres que gritavam 
“Fica pílula, fora Cunha!”. 

Por conta de toda a polarização do primeiro semestre 
e da enorme instabilidade política criada, o impeachment 
acabou entrando em pauta no segundo semestre de 2015 
e acabou por ter o seu encaminhamento aprovado em 
dezembro. Isso ocorreu não só por conta de manobras dos 
adversários de Dilma na Câmara, mas também porque 
importantes setores empresariais, incluindo aí muitos 
aliados do governo, cansaram de lidar com uma bolsa volátil 
e com o risco de terem seus executivos citados nos autos 
da Lava Jato (como ocorreu com algumas das principais 
empresas e bancos do país, cujos presidentes foram parar 
na cadeia) e resolveram apostar em uma solução rápida 
para “por ordem na casa”. 



As manifestações da oposição de direita tem reunido o que há de 
mais reacionário no país, como defensores da ditadura militar, inte- 
gralistas, monarquistas e neonazistas 


Dilma e o PT passaram a jogar o jogo palaciano 
de Cunha e inicialmente brecaram o processo de 
impeachment utilizando de trocas de favores com Ministros 
do STF e jogando no ventilador a corrupção do próprio 
Cunha por meio de alguns aliados do governo que estavam 
a “abrir o bico” nas delações premiadas da Lava Jato. A 
única interação do PT com as ruas nesse contexto em que 
se encontrava com a corda no pescoço foi a utilização 
da CUT e do MST para formarem frentes amplas com o 
objetivo de se blindar dos ataques que vinha sofrendo (e 
também gestar uma alternativa eleitoral viável para 2018), 
tais como as Frentes “Brasil Popular” e “Povo Sem Medo” 
- que, hipocritamente, fizeram críticas mais ou menos 
duras ao ajuste fiscal na forma de um “Fora Levy”, mas 
que ignorava por completo a responsabilidade de Dilma 
no mesmo. 

A Operação Lava Jato é um fator importante a ser 
considerado, especialmente porque o atual retomo do 
impeachment à pauta da Câmara se deu na esteira da recente 
delação do senador petista Delcídio Amaral, implicando 
Dilma e Lula. Aos poucos está ficando claro quais são os 
interesses político-econômicos que movem o juiz Sérgio 
Moro e Cia. [7].É fato que a dinâmica de prisões com 
base em denúncias, que leva os presos a realizarem novas 
denúncias, e assim por diante, está jogando no ventilador 
toda a podridão do meio empresarial e político brasileiro. 
Porém, a mídia coiporativa está trabalhando duro para 
preservar seus “protegidos” do PSDB, igualmente 
envolvidos na sujeirada, enquanto usam a investigação 
para reforçar seu ataque contra o governo e o PT. 

Como se pode ver por essa breve síntese do que foi 
2015 e o começo deste ano, os desafios que surgiram para 
a esquerda não foram poucos - e muitas deles seguem em 
aberto. Houve muita confusão quando a direita conseguiu 
mobilizar nas ruas contingentes consideráveis até abril; 
sobre a forma de como reagir ao ajuste fiscal promovido 
por Dilma/Levy em um contexto no qual o PT estava sob 
pesado ataque da mídia e risco real de perder o Planalto 
Central; e às frentes amplas criadas pelos govemistas para 
se blindar nas ruas. No presente momento, a confusão 


otempo.com.br 


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segue em relação ao impeachment e, especialmente, ao 
ajuste fiscal. Sem uma resposta correta a essas questões, é 
impossível que a classe trabalhadora consiga se apresentar 
enquanto a necessária alternativa à onda conservadora e 
aos ataques do governo. 

Qual deve ser a tática da classe trabalhadora? 

Enquanto luta contra o avanço da “onda 
conservadora” de ataques aos direitos, é imprescindível 
que não haja nenhuma capitulação ao governo. Dilma 
nada está fazendo para frear o crescimento dos movimentos 
conservadores. Lembremos que depois das manifestações 
de março, ela ofereceu “dialogar” com os organizadores e 
acatou os desejos do grande capital via o “ajuste” de Levy. 
Está de mãos atadas por suas alianças com políticos e 
partidos conservadores para administrar o Estado burguês. 
Seu recente acordo com a cúpula tucana para abrir o pré-sal 
aos capitais imperialistas e a sanção da “Lei Antiterrorista” 
deixa claro que ela fará ataques cada vez maiores aos 
trabalhadores como forma de ganhar tempo junto a seus 
adversários. 

Em outras palavras, embora estejam sendo visados 
pela grande imprensa e pela oposição direitista, o governo 
é parte e cúmplice da “onda conservadora”, pois está 
realizando todas as medidas demandadas pelo grande 
capital. Por conta disso, as frentes “BrasilPopular” e 
“Povo Sem Medo”, criadas em resposta ao ascenso da 
direita e que supostamente estão em luta contra o “ajuste 
fiscal”, não passam de uma tentativa de salvar o mesmo 
nesse momento de instabilidade. Consequentemente, 
cooperam indiretamente com seus ataques contra os 
explorados e oprimidos do país. 

O mesmo papel lamentável de blindar o governo 
vem cumprindo o PCO, organização que suja o nome do 
trotskismo com sua colaboração de classes governista, 
conforme já denunciamos em Da histeria golpista à Copa 
do Mundo. As capitulações do PCO ao governismo (julho 
de 2014). Esse partido vem escondendo quaisquer críticas 
ao governo e só fala da “luta contra o golpe”, participando e 
elogiando entusiasticamente cada manifestação governista 
pró-Dilma. 

Sem fazer coro com enorme histeria criada pelos 
govemistas e seus ajudantes, como se estivesse em curso 
uma derrubada do governo à lá golpe de 64, cabe apontar 
que partidos e tendências reacionárias de todo tipo vem 
ganhando fôlego. O fascismo, por exemplo, vem de fato 
crescendo no país. Um novo partido neonazista foi fundado 
no Brasil no final do ano passado. Apesar do evento de seu 
lançamento, unindo diversos grupos extremistas (como 
os conhecidos “Carecas de SP”) ter sido cancelado em 
cima da hora, por temor de uma reação organizada da 
esquerda, ele já possui site e vem organizando diretórios 
regionais. 18 ] O sentimento anticomunista (associado 
cretinamente ao governo neoliberal do PT) cresceu muito 
na sociedade no último período, principalmente devido ao 
trabalho dos direitistas nas redes sociais. 


O movimento dos trabalhadores e as organizações 
de luta contra as opressões devem estar atentos e ter 
unidade de ação para combater quaisquer agressões ou 
ameaças que se coloquem em seu caminho. Seja por 
parte de grupos fascistas - que ainda são uma pequena 
minoria, mas que vem surfando com certo sucesso na onda 
do crescente conservadorismo, seja por parte da “nova” 
velha direita do MLB/Vem Pra Rua/Revoltados Online, 
cujos membros já protagonizaram mais de um episódio de 
violência contra membros dos movimentos sociais. Nossa 
resposta a esse lixo deve ser dada nas ruas, denunciando 
seu pensamento rasteiro e as suas verdadeiras intenções de 
servir ao grande capital, do qual são tropas de choque, bem 
como se preparando para responder concretamente à sua 
violência com todo vigor sempre que necessário. 

Além disso, está claro que devemos rejeitar e 
denunciar esse impeachment e demais manobras da 
oposição de direita. Dilma merece ser julgada por seus 
crimes contra a classe trabalhadora, como os cortes de 
direitos e a cumplicidade com a repressão, a continuidade 
da entrega das riquezas do país ao imperialismo etc. O 
mesmo vale para Lula. Mas só quem pode fazer isso é a luta 
da classe trabalhadora, para barrar e reverter as medidas 
do governo e confrontá-lo diretamente. O impeachment, 
por outro lado, é uma manobra da oposição PSDB/DEM e 
de setores do PMDB que querem assumir eles próprios o 
governo. Esses senhores querem capitalizar a crise do PT e 
de Dilma para seu próprio benefício. Uma queda de Dilma 
por essa via não beneficia os trabalhadores e, nesse caso, não 
mudaria a onda de ataques, mas ao contrário, a intensificaria. 
Nós do Reagrupamento Revolucionário nos opomos 
ao impeachment não por capitulação ao PT, mas sim por 
reconhecermos esse processo como uma cortina de fumaça 
da oposição de direita para se aproveitar da insatisfação da 
população, angustiada e cansada pelos ataques que vem 
sofrendo por parte da burguesia e do governo. 

O elemento essencial para que a classe trabalhadora 
enfrente a atual conjuntura com sucesso é a formação de 
um polo independente da oposição de direita e do governo, 
que unifique as várias lutas em curso (abrindo sempre 
novas frentes) em tomo dos eixos .Contra os ataques do 
governo e seu “ajuste fiscal”! Nenhum corte de verbas 
dos serviços públicos, retirada de direitos ou demissões! 
Contra a criminalização dos movimentos sociais da 
Lei antiterrorismo! Que os patrões paguem pela crise! 
Contra a oposição de direita e sua manobra hipócrita 
de impeachment! Essa deve ser uma frente de unidade 
nas lutas, baseada nessas posições fundamentais para os 
trabalhadores no atual momento. Ao mesmo tempo, dever 
permitir a todos os grupos e partidos da classe trabalhadora 
que queiram participar uma ampla liberdade de discussão 
e crítica. 

Os govemistas negam a existência de uma situação 
de crise econômica (mais precisamente, de recessão - que 
será aprofundada com a política de ajuste fiscal de Dilma), 
alegando que tudo não passa de “complô da oposição” e 
“invenção da mídia”, e se usam da “onda conservadora” 


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para tentar angariar apoio popular ao governo. Por outro 
lado, há setores na esquerda que negam o crescimento do 
conservadorismo por encararem que admitir isso implicaria 
defender Dilma politicamente. A formação de um polo 
independe como o que estamos defendendo precisa se opor 
firmemente a esse tipo de “posição automática”. 

No primeiro semestre do ano passado chegaram a 
ocorrer algumas manifestações em capitais como Rio de 
Janeiro e São Paulo, chamadas por partidos de esquerda e a 
CSP-Conlutas, que constituíram experiências embrionárias 
independentes do governo e da oposição de direita, mas as 
frentes de colaboração de classes criadas pelos govemistas 
através da CUT e do MST deram cabo das mesmas, ao 
conseguir recrutar importantes setores que as compuseram, 
tais como boa parte das correntes do PSOL e o MTST, 
como discutiremos a seguir. A luta contra a direita e o 
govemismo ganhou novo fôlego com a belíssima luta 
protagonizada pelas mulheres contra Cunha, no segundo 
semestre de 2015, mas segue aberta a tarefa de formação 
de um polo de independência de classe e combativo. 

Obstáculos e desvios colocados por duas posições na 
esquerda: PSOL e PSTU 

Desde outubro do ano passado, o PSOL e a maior 
parte de suas correntes têm participado da Frente Povo 
Sem Medo, incluindo aí alguns grupos que se reivindicam 
trotskistas, como Insurgência, o MES e a LSR [9]. Essa 
frente diz ter como objetivo a defesa da classe trabalhadora 
contra o ajuste fiscal: 

“O ‘ajuste fiscal’ do governo federal diminui 
investimentos sociais e ataca direitos dos 
trabalhadores. Os cortes na educação pública, o 
arrocho no salário dos servidores, a suspensão dos 
concursos são parte dessa política. Ao mesmo tempo, 
medidas presentes na Agenda Brasil, como aumento 
da idade de aposentadoria e ataques aos de direitos e 
à regulação ambiental também representam enormes 
retrocessos. Enquanto isso, o 1% dos ricos não 
foram chamados à responsabilidade. Suas riquezas 
e seus patrimônios seguem sem nenhuma taxação 
progressiva. O povo está pagando a conta da crise.” 
Frente Povo Sem Medo será lançada nessa quinta 
em SP, 5 de outubro de 2015. Disponível em: http:// 
tinyurl. c om/hx6tcpk. 

Porém, não pode ser ignorado que essa Frente é 
composta em sua maioria por organizações que fazem 
parte do governo que está realizando todos esses ataques 
contra a classe trabalhadora: PT, PCdoB, CUT, UNE, entre 
outros, e se usam da mesma para blindar Dilma. Atacam 
o “ajuste fiscal” apresentando-o como obra do capital 
financeiro, mas suas críticas a Dilma são simbólicas, isso 
quando aparecem. A “onda conservadora” é apresentada 
como um fenômeno que não tem a ver diretamente com 
o governo. Essas organizações nunca explicam porque 
seguem sendo base de apoio a Dilma. A própria formação 
da Frente foi uma tática sua para tentar se reinserir no 


movimento, do qual estiveram ausentes, e lutar contra 
os projetos da bancada conservadora no legislativo sem 
encostar no governo, fazendo uma crítica “comportada” ao 
mesmo, na melhor das hipóteses. Vejamos, por exemplo, a 
convocatória para manifestações que estão sendo chamadas 
para o dia 3 1 de março: 

“Os eixos da mobilização unitária são os seguintes: 
Contra a Reforma da Previdência; Não ao Ajuste 
Fiscal e cortes nos gastos sociais; Em defesa do 
Emprego e dos Direitos dos Trabalhadores; Fora 
Cunha; Contra o Impeachment.” 

Nota sobre a mobilização nacional de 31/3, 16 de 
fevereiro de 2016. Disponível em http://tinyurl. 
com/jpqyck6. 

Esse chamado é assinado pela Frente Povo sem 
Medo e pela Frente Brasil Popular e não é atípico do seu 
conteúdo de nenhuma denúncia ao governo. Portanto, 
o papel que cumpre essa Frente Povo sem Medo, assim 
como a Frente Brasil Popular, é de ser um obstáculopam a 
conformação de uma frente de luta efetiva e combativa da 
classe trabalhadora contra o conservadorismo e também 
os ataques do governo. Ao se atrelar à “ala esquerda” de 
um dos campos burgueses em disputa, o PSOF enfraquece 
a perspectiva de derrotar os ataques, que só pode ser 
vitoriosa travando uma verdadeira guerra de classe contra 
ambos governo e os direitistas pró-impeachment. A Frente 
é contra o impeachment, mas não fala uma palavra do 
governo em 90% das ocasiões. Quando o faz, é com um 
tom ameno. 

Um militante honesto do PSOF poderia argumentar 
que a participação do partido seria uma tática para rachar a 
base do governo, chamando isso de “frente única”. A frente 
única conforme defendida pela Internacional Comunista em 
sua época revolucionária é uma unidade de ação em tomo 
de bandeiras de interesse comum para os trabalhadores, na 
qual os partidos revolucionários poderiam mostrar também 
a superioridade do seu programa e ganhar os trabalhadores 
para o mesmo. De fato, o PT e o PCdoB ainda possuem 
influência sobre uma base que esperamos um dia que 
sejam ganhos para a revolução. Mas mesmo que essa 
frente pudesse articular uma luta combativa contra o ajuste 
fiscal, o que não vai acontecer, o PSOF deveria travar uma 
batalha encarniçada contra os govemistas, denunciando 
o uso que eles querem fazer da mesma. Mais uma vez, 
isso não ocorre. O problema com essa suposta “tática” do 
PSOF é que em suas declarações sobre a Frente Povo sem 
Medo, ele deixa de lado todas as críticas aos govemistas 
para manter a unidade. Vejamos, como exemplo, a sua nota 
sobre o lançamento da Frente em São Paulo. 

“Diversas entidades e movimentos sociais convidam 
para o lançamento da Frente Povo Sem Medo, nesta 
quinta-feira (...). Uma frente política que propõe 
saídas à esquerda para a crise brasileira, contra 
qualquer ataque aos direitos dos trabalhadores, seja 
do governo federal, seja de sua oposição de direita. O 
PSOF soltou uma resolução nacional nesta semana 
chamando sua militância a se incoiporar a esta 


7 


frente, inclusive diversos de nossos parlamentares 
são signatários de sua carta convocatória.” 
Carta Convocatória de lançamento da Frente 
Povo sem Medo , 7 de outubro de 2015 
Disponível em: http://tinyurl.com/hd5fly5 
Em seguida é reproduzida a carta de lançamento 
da Frente, no tom que já explicamos. Mas em nenhum 
momento dessa convocatória do PSOL existe uma crítica 
ao PT, PCdoB, CUT, UNE etc. etc. Será que a frente propõe 
mesmo “saídas à esquerda” para a crise? Esses govemistas 
querem, de fato, uma transformação do país? Sustentar isso 
seria demais até para o PSOL. Em outros artigos, sobre a 
difusão da Frente pelos estados ou no lançamento da mesma 
no Maranhão, a mesma coisa acontece. Nem mesmo uma 
linha sobre os “aliados” do PSOL nessa Frente [10J. Com 
isso, o que o PSOL está fazendo não é direcionar essa 
Frente para lutar contra o governo e os govemistas, até 
porque isso não seria aceito pelos mesmos. 

O PSOL está é se adaptando à posição dessas forças. 
Quando o objetivo comum é blindar um governo burguês 
e os seus apoiadores de críticas sobre os crimes cometidos 
contra a classe trabalhadora, o nome disso não é “frente 
única”, mas oportunismo. Esse oportunismo tem raiz na 
falsa crença de que Dilma e o PT são um “mal menor” que 
deve ser apoiado em relação à oposição de direita, posição 
defendida pela direção do PSOL e muitas de suas figuras 
públicas, como Jean Wyllys e Marcelo Freixo, que também 
chamaram a votar por Dilma no segundo tumo das últimas 
eleições, dizendo que ela defendia “direitos humanos” e 
das minorias [Hl 

O governo composto pelo PT foi a ponta de lança 
dos ataques contra a nossa classe. Nesse momento em que 
grande parte dos trabalhadores passa a nada esperar do PT, 
um partido revolucionário teria terreno fértil para erguer, 
do cemitério do programa govemista de conciliação com 
a burguesia, uma alternativa classista para a solução dos 
problemas do proletariado. Ao invés disso, os líderes do 
PSOL optam por ajudar a blindar um inimigo da classe 
trabalhadora que é esse governo, ao dar cobertura pela 
esquerda na Frente Povo sem Medo. Apesar da direção 
do MTST (principal componente da Frente) parecer ter 



O PSTU tem mobilizado seus bastiões sindicais em diminutas mar- 
chas pelo “Fora Todos”. Nesses mesmos bastiões, não se viu entu- 
siasmo semelhante para lutar contra demissões massivas... 


enfim se dado conta do beco sem saída dessa política 
conciliatória, anunciando recentemente (7 de março) 
que passará a fazer firme oposição ao governo Dilma e 
que mobilizará sua base em uma jornada de lutas, tudo 
indica que essa Frente (da qual o MTST não se retirou) 
continuará blindando Dilma. Por isso chamamos o PSOL 
e todos os seus militantes a romper com a mesma, que só 
pode atrapalhar a organização da classe trabalhadora para 
lutar contra o ajuste fiscal. 

O PSTU tem uma posição distinta. Eles também 
têm criticado a presença do PSOL nessa Frente com o 
govemismo e chamado, corretamente, pela composição de 
um polo da classe trabalhadora em oposição ao governo e 
à direita: 

“Os trabalhadores e a maioria do povo não devem 
apoiar Dilma, nem apoiar Cunha-Aécio, que 
defendem que governe Michel Temer ou Aécio 
Neves com esse Congresso. A classe trabalhadora 
e a juventude precisam ir à luta em defesa das suas 
reivindicações e contra todos eles. E através da 
mobilização para botar todos eles para fora, em defesa 
das nossas reivindicações e contra o ajuste fiscal 
que todos eles defendem, que podemos construir 
uma alternativa dos de baixo para governar o país.” 
Fora Dilma, Fora Cunha, Fora Temer, Fora Aécio 
e esse Congresso Nacional! Fora todos eles!, 3 de 
dezembro de 2015. Disponível em http://tinyurl. 
com/z5zwnb2. 

Porém, estamos em desacordo com a posição do 
PSTU em dois níveis. O primeiro é que a proposta do PSTU 
para a investida contra os inimigos da classe trabalhadora 
está em tomo do chamado por “eleições gerais”: 

“De imediato, se ainda não temos uma organização 
dos trabalhadores e do povo pobre apoiada nas 
suas lutas para governar, que é o caminho que 
pode garantir mudança de verdade, então que se 
convoquem novas eleições gerais no país, para 
presidência da República, senadores, deputados 
federais e governadores. Que o povo possa trocar 
todo mundo, se quiser. O que não dá para aceitar é que 
qualquer um desses que estão aí hoje governem.” 
Ident. 

Acreditamos, como o PSTU sustenta, na necessidade 
de um governo de trabalhadores baseado em nossas 
organizações de luta e estabelecido por uma revolução para 
resolver a crise econômica e as desigualdades e absurdos 
m desse país. Mas enquanto uma revolução não é sentida 
I pelos trabalhadores brasileiros como uma necessidade e o 
3 socialismo está distante do seu horizonte de expectativas, 
w existe uma ampla insatisfação com o “ajuste fiscal”, o 
^ qual é defendido por todos os partidos da burguesia. Um 
^ movimento de trabalhadores independente de todas as 
° frações burguesas para combater esse ajuste e os cortes do 
g governo é uma perspectiva viável e que prepararia nossa 
classe para começar a agir como uma “classe para si”, 
ou seja, na defesa combativa de seus próprios interesses. 
A proposta do PSTU por eleições gerais, porém, vai 



8 


na contramão de ambas perspectivas. A tática de unidade 
na luta contra o ajuste e os cortes de direitos avança para 
uma ação independente dos trabalhadores. Já querer 
eleições gerais como um objetivo para o atual período de 
instabilidade só serviria para desviar as expectativas do 
proletariado para o pântano lamacento da falsa democracia 
dos ricos, ainda que os pivôs dos escândalos de corrupção 
não participassem, como o PSTU defendeu em outras 
declarações. A burguesia nunca tem dificuldades em repor 
seus fantoches e homens fortes. Nesse sentido, é também 
equivocada, e cumpre igualmente papel de desvio, a linha 
assumida pelo MRT/Esquerda Diário, de chamar por uma 
Assembleia Constituinte [ 12 ] - uma li nh a recorrente desse 
grupo, à qual futuramente dedicaremos uma polêmica à 
parte. 

Qualquer partido revolucionário deveria saber 
que as eleições burguesas são nada mais que um jogo de 
cartas marcadas, e que a burguesia só financia e divulga 
maciçamente aquelas campanhas dispostas a defender os 
seus interesses. Além disso, os trabalhadores não podem 
decidir, nas eleições, sobre as questões que realmente afetam 
as suas vidas, nem a forma como seu local de trabalho será 
gerido, nem quem pagará pela crise econômica, nem sobre 
leis cortando seus direitos, por exemplo. As eleições não 
passam de uma oportunidade que o proletariado tem para 
escolher os seus carrascos. 

Marxistas normalmente chamam por eleições gerais 
em casos quando estas se contrapõem a uma ditadura 
que reprime todas as formas de liberdades democráticas 
burguesas. Nesses casos, o chamado por eleições serve 
para desmascarar regimes ditatoriais e representa a abertura 
de um espaço político para agitação revolucionária. 
Especialmente quando a população tem expectativas de 
que as coisas seriam drasticamente diferentes em uma 
democracia. Mas no atual cenário brasileiro, a população 
e os trabalhadores em especial sentem profundo desdém e 
não acreditam no sistema eleitoral burguês. 

Os revolucionários podem continuar usando, 
em momentos de calmaria, os períodos eleitorais para 
denunciar a farsa que as eleições representam. Mas de 
forma alguma é aceitável apresentar a proposta de um 
novo processo eleitoral nesse momento, quando o que a 
conjuntura exige é uma luta incansável contra os ataques 
do governo e da direita. Um processo eleitoral no meio das 
lutas serviria somente para desviar as atenções, seria um 
caminho para longe dos esforços pela construção imediata 
de um polo classista. Sem contar que as eleições gerais que 
se seguiriam à queda da presidente, seriam provavelmente 
ganhas pela oposição de direita. De que forma isso ajudaria 
a barrar os ataques da burguesia contra nossa classe? É 
uma pergunta difícil de responder mesmo para o PSTU. 

Outro aspecto da posição do PSTU com qual temos 
desacordo ainda não é, até o momento, tão concreto. É a 
sua tendência a flertar com as investidas contra o governo 
Dilma mesmo se partirem da oposição de direita. A LIT, 
organização internacional da qual o PSTU faz parte, 
tem mantido de forma consistente a linha de enxergar 


qualquer movimentação de massas contra o governo da 
vez como algo progressivo, sem considerar o caráter de 
classe que está à frente do movimento de oposição e quais 
forças efetivamente dirigem a derrubada do governo da 
vez. Fizeram isso na Líbia, ao não ter nenhum pudor de 
reivindicar uma unidade de ação com a OTAN para derrubar 
o ditador Kaddafí; na Síria, ao apoiar os reacionários 
rebeldes do Exército Livre da Síria, de programa burguês 
pró-imperialista, como uma alternativa ao tirano Assad; na 
Ucrânia, ao chamar de “revolução” e apoiar o levante do 
EuroMaidan, dirigido pela direita pró-União Europeia; no 
Egito, ao sustentar que o golpe militar que derrubou o ex- 
presidente da Irmandade Muçulmana foi uma “revolução 
vitoriosa’ ’. [ 13 ] Essa é a mesma tendência que permitiu à 
corrente internacional do PSTU enxergar a queda da URSS 
e demais Estados operários burocratizados europeus no 
começo dos anos 1990 como uma “vitória histórica dos 
trabalhadores ” [ 14 ]. 

Tal tendência não foi, por ora, levada até esses 
extremos. O PSTU tem rejeitado abertamente se somar 
aos atos organizados pelos opositores de direita e não 
apoia o impeachment, embora dificilmente o partido se 
pronuncie contra este processo. Ao longo dos meses, 
disse que “não o propõe”: “O PSTU não está propondo 
impeachment da presidenta Dilma. Não queremos colocar 
nas mãos deste Congresso Nacional, corrupto e controlado 
pelo poder econômico, a solução da crise vivida pelo 
país ” ( Quem faz o jogo da direita, 28 de julho de 
2015). Ou então que um impeachment “não basta”: “Por 
isso dizemos que não basta tirar a Dilma. E necessário 
colocar para fora também toda essa corja do PMDB e 
do PSDB, começando pelo picareta maior do Eduardo 
Cunha, Temer, Aécio Neves e esse Congresso... ”. ( Nota da 
Direção Nacional do PSTU, 3 de dezembro de 2015). 

A ideia de que o impeachment “não basta” ou “não 
resolve nossos problemas” (como também foi expressa) 
está diretamente relacionada à palavra de ordem de “Fora 
Dilma, Fora Cunha, Fora Temer, Fora Aécio e esse 
Congresso Nacional! Fora todos eles!’’ defendida pelo 
PSTU. Idealmente, somos a favor de um “fora todos” 
no sentido de que queremos tirar do poder todos os 
representantes da burguesia. Porém, defender essa demanda 
na atual conjuntura, em que a única possibilidade concreta 
é que o “Fora Dilma” leve a um governo do PMDB-PSDB, 
não é advogar a causa do proletariado, mas ser indiferente 
quanto às conclusões a que a concretização dessa demanda 
poderia levar. Isso seria diferente se a ameaça pairando sobre 
Dilma fosse a do movimento da classe trabalhadora, é claro. 

Não é à toa, porém, que foi quando a perspectiva 
do impeachment se tomou concreta que o PSTU passou a 
defender tal demanda. Mais seriamente, em certa ocasião 
um dos principais dirigentes do PSTU apoiou (no seu 
perfil nas redes sociais) um “panelaço” da classe média 
conservadora contra os pronunciamentos de Dilma, 
dizendo que era “perfeitamente merecido”: 

PANELAÇO NA DILMA E NO PT! MAS 

PANELAÇO TAMBÉM NO AÉCIO E NO PSDB! 


9 


PANELAÇO NESTA CORJA TODA! 
“Inacreditável a cara de pau da direção do PT no 
programa que acaba de ir ao ar na TV. Mostram 
um país que só existe no conto da carochinha dos 
dirigentes deste partido e seu governo. E acham que 
enganam alguém com isso. Perfeitamente merecido 
o panelaço que se ouviu por todo lado durante o 
programa. Mas panelaço não pode ser só no PT e 
na Dilma, não. Tem de ser também no Aécio e no 
PSDB, no Temer e Eduardo Cunha do PMDB, tem 
de ser panelaço neles todos. Eles estão unidos para 
atacar os direitos dos trabalhadores e para defender 
o lucro dos bancos”. 

Zé Maria, 6 de agosto de 2015. Disponível em 
http://tinyurl.com/gv4w4j3. 

Os revolucionários não se opõem ao impeachment 
por considerar o PT uma organização operária ou seu 
governo com sendo de esquerda. Não, sabemos que são 
um partido e um governo dos patrões, que merecem a 
cova, junto com os tucanos e o restante da direita. Mas 
o algoz do PT não deve ser um impeachment e nem os 
tribunais controlados pela direita, mas sim a classe 
trabalhadora organizada. Portanto, denunciamos e nos 
opomos firmemente à hipocrisia do impeachment do 
PSDB-PMDB como uma tentativa de angariar os frutos 
do desgaste do governo. O chamado por um ‘‘Fora Dilma! 
Fora Todos! ” defendido pelo PSTU - e também pela CST 
(PSOL) [15] - não prioriza a perspectiva de derrotar o 
governo Dilma e suas políticas antioperárias, mas sim a 
sua retirada ou saída do poder, sem que o movimento da 
classe trabalhadora esteja pronto, nesse momento, para se 
beneficiar disso e quando só a oposição de direita pode 
fazê-lo. Reafirmamos que somente a formação de um polo 
proletário independente tanto da oposição direitista quando 
do governo Dilma oferece a perspectiva de derrotar esses 
dois algozes. 

O cerco sobre Lula e as falsas expectativas na Operação 
Lava Jato 

Com o vazamento da suposta delação do senador 
petista Delcídio Amaral pela revista Isto É, no último dia 3 
de março, a situação de Dilma se tomou ainda mais instável 
e o ex-presidente Lula foi posto no olho do furacão. Lula, 
a atual aposta do PT para as eleições de 2018, foi levado 
a depor coercitivamente pela Polícia Federal no dia 4 de 
março e teve prisão preventiva solicitada pelo Ministério 
Público de São Paulo. Apesar das acusações contra ele e 
Dilma não estarem confirmadas, a oposição de direita e 
setores do PMDB voltaram a bradar pelo impeachment e a 
convocação para a manifestação que organizam para o dia 
13 de março ganhou muito mais fôlego. Ante essa situação, 
de novos atos de ma convocados pela oposição de direita 
e por grupos da “nova” direita, reforçamos aquilo que 
dissemos em relação às manifestações do início de 2015. 
O mesmo vale para nosso posicionamento em relação ao 
impeachment contra Dilma. 


Porém, a reposta dada ao evento por setores da 
esquerda reforçam nossas críticas a esses partidos e grupos. 
A direção da CSP-Conlutas, hegemonizada pelo PSTU, 
emitiu uma nota em que não questiona a arbitrariedade e 
as intenções de Moro e da Polícia Federal e demandou que 
também Cunha, Aécio e Cia. fossem investigados: 

“Assim, não podemos cair no discurso que essa 
ação [a investigação sobre Lula] é um ‘golpe da 
direita’, precisamos exigir que as investigações 
avancem e cheguem a todos os políticos corruptos e 
às empresas corruptoras. E dessa forma que vamos 
virar esse jogo para o lado dos trabalhadores.” 

Não basta avançar na investigação sobre Lula, é 
preciso apurar também as falcatruas do PSDB, 
PMDB, DEM e outros partidos de direita!, 12 
de março de 2016. Disponível em http://tinyurl. 
com/zu82883. 

Qualquer um pode ver que essa ação faz parte da 
sórdida investida da oposição de direita contra o PT, além do 
que cruza a própria legalidade de investigações criminais. 
Aqui, a direção da CSP-Conlutas parece confiar na Lava 
Jato (que não é criticada em nenhum momento do artigo) 
para investigar todos os outros partidos da burguesia. 
Quaisquer que sejam os interesses “justiceiros” de Moro 
e da Lava Jato, a condução das operações está prestando 
auxílio às intenções dos setores da oposição de direita para 
criar instabilidade. Um partido revolucionário não deveria 
delegar à polícia e à justiça dos patrões a tarefa de realizar 
a limpeza dos corruptos, pois é evidente que isso não 
acontecerá. Como a própria nota da CSP-Conlutas afirma, 
“a burguesia protege os seus”. Não há motivo, portanto, 
para crer que a continuidade de investigações da Lava Jato 
irá “virar esse jogo para o lado dos trabalhadores”. Como 
afirmamos, esta é uma manifestação da tendência de não 
diferenciar os golpes sofridos pelo governo e PT por parte 
da classe trabalhadora daqueles que vêm, ou acabam sendo 
instrumentalizados, pela oposição de direita. 

O PSOL também está dando apoio à continuidade das 
investigações. O site do partido afirmou que “Apoiamos o 
aprofundamento das investigações, na expectativa de que 
sejam levadas até o fim, sem qualquer diferenciação entre 
os acusados, tendo prerrogativa de foro ou não. ” [16] Essa 
“expectativa” é uma ilusão séria. ALava Jato já demonstrou 
que não vai se colocar a serviço de uma investigação da casta 
política ou do meio empresarial de forma imparcial. N ão será 
“levada até o fim” pois a Justiça burguesa não pode fazê-lo. 

A CST/PSOL emitiu nota de teor semelhante, 
em que demanda o aprofundamento das 
investigações e diz que “Lula e Dilma devem ser 
investigados e punidos!’’ [17] Mas por quem? Nós 
do Reagrupamento Revolucionário encaramos que Lula, 
Dilma, Aécio, Cunha e cia. precisam sim ser investigados, 
mas não conferimos confiança alguma à justiça burguesa. 
Apenas o movimento operário organizado tem legitimidade 
para realizar uma investigação séria contra essa corja, a 
começar pela devassa das finanças das grandes empresas 
envoltas em toda essa falcatrua. E vemos necessidade de 


10 


denunciar firmemente a forma como Moro e a PF vem 
atuando, que revela a podridão dos aparelhos repressivos 
do Estado burguês. 

Mas se a posição da direção da CSP-Conlutas e 
da CST/PSOL são preocupantemente equivocadas, cabe 
ressaltar que a do MNN/Território Livre ultrapassa todos 
os limites do bom senso. Tal grupo emitiu duas notas em 
que efetivamente comemorou ditas ações e ainda pediu 
pela imediata prisão de Lula e queda de Dilma, com a 
demanda ‘‘Que Lula seja preso!” [ 18 ], alegando que isso 
favorecerá as condições para a construção de organizações 
revolucionárias. Uma ilusão delirante de que um processo 
controlado pelo Estado e pela Justiça dos patrões e posto 
a serviço dos direitistas pode trazer frutos políticos para o 
proletariado. 

Esses novos acontecimentos em nada alteram nossa 
posição de oposição ao governo Dilma. Tampouco vemos 
motivos para baixar o tom quanto ao papel histórico 
cumprido por Lula de trair e conter os movimentos da 
classe trabalhadora. Com o acirramento dos ânimos, 
govemistas tem inclusive assumido posturas agressivas 
que devem ser rechaçadas com o necessário vigor pelo 
conjunto dos movimentos sociais e da esquerda, como a 
censura e tentativa de agressão a militantes do Movimento 
Mulheres em Luta (que compõe a CSP-Conlutas) no ato de 
8 de março em São Paulo. Da mesma forma, os direitistas 
mais fanáticos e com tendências fascistoides realizam 
agressões contra sedes de sindicatos da CUT, militantes 
ou mesmo pessoas aleatórias vestidas de vermelho que 
passam pelas suas manifestações. É preciso unidade dos 
lutadores para rebater esses reacionários violentos, com 
todos os meios necessários. O govemismo e a reação de 
direita devem ser derrotados nas lutas e ruas, por meio da 
mobilização e unidade da classe trabalhadora. 

NOTAS 

[ 1 ] Institutos de pesquisa fazem levantamentos sobre o perfil dos 
manifestantes em Porto Alegre, 16 de março de 2015. Disponível 
em: http://tinyurl.com/m39kn27 

[2] Conforme A nova roupa da direita. Pública, 23/06/2015 
(disponível emhttp://tinyurl.com/plbh27b), Três grupos organizam 
os atos anti-Dilma, em meio a divergências, El País Brasil, 
15/03/2015 (disponível em http://tinyurl.com/jpky7rz) eQuern 

financia os grupos que pedem o impeachment? , Diário do Centro 
do Mundo, 15/03/2015 (disponível em http://tinyurl.com/j4kwkyl). 

[ 3 ] Contrariando lideres tucanos, FHdiz que pedido de impeachment 
è precipitado, O Globo, 19/04/2015. Disponível em: http://tinyurl. 
com/hc4fveo. 

[ 4 ] Sobre os defensores da “Escola Austríaca”, que tem dado as 
caras no Brasil recentemente, ver o artigo de André Augusto, O que 
está em jogo no ‘‘Mais Mises, Menos Marx ” . Disponível em: http:// 
tinyurl.com/jag83aj. 

[ 5 ] Conforme Barraco na direita: Olavo, Reinaldo, Constantino, 
Bolsonaro eKataguiri trocam acusações, Portal Fórum, 13/01/2016. 
Disponível em: http://tinyurl.com/j3vl8xj. 

[6] A esse respeito, ver “Tomar as massas em seu movimento ”, site 
do MNN, 17/03/2015 (disponível em http://tinyurl.com/ 
hptdyvy), Fora Dilma, Fora Todos!, Facebook do MRS, 1 6/08/20 1 5 


(disponível em http://tinyurl.com/h9uo4gh), O Brasil precisa 
de uma Grande Revolução, Jornal a Nova Democracia n. 147, 
março/2015 (disponível em: http://tinyurl.com/h51gjmh) c Porque 
ir aos atos do dia 13 de março?, Facebook do MRS, 12/03/2016 
(disponível em http://tinyurl.com/h8uv2un). 

[ 7 ] Recente pesquisa do Esquerda Diário indica que se trataria de 
uma forte resposta de um bilionário cartel internacional de produção 
de navios-sonda à tentativa de formação de um cartel competidor 
“tupiniquim”. Esquerda Diário investiga delações, Esquerda 
Diário (portal do MRT), 29/01/2016. Disponível em: http://tinyurl. 
com/j7tg9y4. 

[ 8 ] Conforme Fascistas vão fundar a Frente Nacionalista em 
Curitiba com um festival lotado de banda ruim, Vice, 11/12/2015 
(disponível em http://tinyurl.com/zj792q4) e Grupo fascista cancela 
congresso na região de Curitiba, Gazeta do Povo, 11/12/2015 
(disponível em http://tinyurl.com/hohxs5q) 

[ 9 ] O PSOL é um partido formado por tendências, de forma que 
nem todas assinam a participação na Frente Povo sem Medo. Os 
movimentos do PSOL que aparecem assinando o lançamento da 
Frente são os seguintes: Coletivo Juntos, Juventude Socialismo 
e Liberdade (JSOL), RUA - Juventude Anticapitalista, Coletivo 
Construção e Bloco de Resistência Socialista. Um notável ponto 
fora da curva foi a corrente morenista CST, seção brasileira da 
UIT. 

[ 10 ] Ver Frente Povo Sem Medo è lançada no Maranhão, com a 
presença do P5'OZ,(http://tinyurl.com/hekglsp), 31 de março é dia 
nacional de luta unificada contra o ajuste fiscal e a reforma da 
previdência (http://tinyurl.com/zqo8djy) e Frente Povo Sem Medo 
começa a se organizar nos estados (http://tinyurl.com/gon6cl7). 
[UI Ver Marcelo Freixo apoia Dilma Rousseff IvrwsN. 
youtube.com/watch?v=on3oysCoxj8) e Jean Wyllys: No segundo 
turno, eu voto em Dz7ma(http://tinyurl.com/gtflrgh). 

[ 12 ] Conforme Por uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana 
imposta pela força da mobilização, de dezembro de 2015 
(http://tinyurl.com/jr9ncc7). Em nosso arquivo histórico há um 
documento de polêmica com a seção irmã do MRT na argentina, 
quando esta adotou linha semelhante na crise política que passou 
aquele país em 2001 (ver Acerca do chamado por uma assembleia 
constituinte na Argentina, de março de 2002, http://tinyurl.com/ 
zxc3oz2). 

[ 13 ] Sobre as posições da LIT / PSTU ante as guerras civis líbia 
e síria e o conflito na Ucrânia e no Egito, ver (respectivamente) 
nossa polêmica De que Lado da Trincheira?, de novembro de 
2011 (http://tinyurl.com/ztu5e67), o artigo do PSTU Quatro 
anos da revolução síria, de março de 2015 (http://tinyurl.com/ 
jc8rtdy), a Declaração da LIT-QI sobre a situação na Ucrânia, 
de maio de 2014 (http://tinyurl.com/jplyqc5) e nossa polêmica O 
golpe militar no Egito e a posição escandalosa do PSTU/LIT, de 
outubro de 2013 (http://tinyurl.com/z4b8718). 

[ 14 ] Ver, por exemplo, O veredito da história, de julho de 2015 
(http://tinyurl.com/zqy78gy). 

[ 15 ] Conforme Nem govemistas, nem tucanos. Fora Todos!, de 
agosto de 2015 (http://tinyurl.com/hctwcng). 

[ 16 ] Conforme “Apoiamos o aprofundamento das investigações 
Nota da bancada do PSOL sobre as novas prisões da Lava 
Jato (http://tinyurl.com/hgpkkjo ). 

[ 17 ] Conforme Lula e Dilma devem ser investigados e punidos!, de 
março de 2016 (http://tinyurl.com/zfmc83v). 

[ 18 ] Confira: Lula na prisão! (5/3/2016 http://www.mo vimentonn. 
org/?p=802 ehttp://tinyurl.com/hwe63t8). 


11 


Café da manhã de Dilma com jornalistas 

A agenda do governo e a resposta necessária da classe 
trabalhadora 


Por Rodolfo Kaleb, fevereiro de 2016 . 



De vermelho, sorridente e ante uma mesa farta, Dilma anunciou aos jornais que hoje a atacam incessantemente os seus planos para fazer 
os trabalhadores continuarem a pagar a crise dos patrões 


Ao longo de 20 1 5 , 0 governo do PT realizou uma série 
de ataques à classe trabalhadora e à juventude do país. Não 
obstante a diminuição de sua base aliada no Congresso e a 
instabilidade criada pela oposição de alas do PMDB e pelo 
PSDB, a gestão de Dilma Rousseff encaminhou, de mãos 
dadas com 0 que há de mais podre na política brasileira, 
como a “Bancada da Bala, Boi e Bíblia” e 0 conjunto dos 
parlamentares sanguessugas do PMDB, projetos de lei 
que atacam os direitos trabalhistas, cortou pesadamente a 
verba da educação e da saúde pública e ainda aperfeiçoou 
os instrumentos de criminalização dos movimentos sociais 
(PL do terrorismo). E tudo indica que este ano será tão 
agitado quanto. 

Logo no começo de 2016, em 15 de janeiro, Dilma 
realizou um café da manhã com jornalistas no Palácio 
do Planalto. Seu conteúdo pode ser acessado em http:// 
tinyurl.com/jlg9dfo ( G1 , 15/01/2016). Ela tem convocado 
coletivas de imprensa como essa com a intenção de melhorar 
a popularidade abalada do seu governo. Numa enorme mesa 
retangular com bastante comida, os jornalistas da grande 
imprensa fizeram várias perguntas à presidente. O recado 
claro foi de que as políticas de austeridade e de ataques 
aos trabalhadores continuarão. Vejamos em detalhes 0 que 
foi discutido e para 0 que nós, trabalhadores, que estamos 
comendo 0 pão que 0 diabo amassou, temos de estar 
prontos. 

Desemprego 


Dilma afirmou que sua maior preocupação é com 0 
desemprego. No cálculo do IBGE para 0 terceiro trimestre 
de 2015, 0 desemprego chegou a 9%. Hoje, 0 número de 
trabalhadores sem carteira assinada deve estar ainda maior. 
A presidente disse: 

“Todo esforço do governo... é para impedir que, 
no Brasil, nós tenhamos um nível de desemprego 
elevado. Para mim, é a grande preocupação, é o 
que nós olhamos todos os dias. É aquilo que mais 
me preocupa e aquilo que requer mais atenção do 
governo 

Mas a preocupação de Dilma não é com a vida dos 
trabalhadores que estão sem poder pagar as contas e em 
dificuldades. Se não, não teria realizado 0 corte de uma 
série de direitos trabalhistas desde 0 ano passado, inclusive 
dificultado 0 acesso ao seguro-desemprego e benefícios 
previdenciários. Nem teria encarregado 0 novo Ministro 
da Fazendo, Nelson Barbosa, de uma nova contrarreforma 
da previdência, que aprofundará 0 ataque aos aposentados 
iniciado em 2003 por Lula. A preocupação de Dilma é 
com os banqueiros e os demais capitalistas que começam 
a sentir no bolso a inadimplência dos serviços (situação 
de 1 em cada 5 famílias) e com a instabilidade econômica 
decorrente. 

Desde meados do ano passado, milhares de operário 
das obras de construção do Complexo Petroquímico do Rio 


planalto.gov.br 



12 


de Janeiro (Comperj) tem feito grandes mobilizações em 
defesa de seus empregos (constantemente ameaçados por 
cortes depessoal) e salários (constantemente atrasados). Em 
Volta Redonda, no estado do Rio de Janeiro, os operários 
da CSN estão passando nesse momento por uma luta 
encarniçada contra milhares dedemissões realizadas pela 
empresa. A rede de supermercados Wal-Mart anunciou o 
fechamento de 60 lojas, o que vai acarretar centenas de 
demissões. Com os cortes nos gastos em obras públicas do 
PAC (8,6 bilhões), somados aos efeitos da crise que vem se 
arrastando, a perspectiva é sombria para o proletariado. 

Diante do cenário de aumento do desemprego, 
nós trabalhadores devemos lutar pela organização 
dos desempregados junto com a luta dos demais 
trabalhadores. Devemos também exigir que os sindicatos 
os organizem. Mas os burocratas que dominam a maioria 
dos sindicatos do país (além da maioria das centrais), 
tomando-os instrumentos de divisão e contenção da classe 
trabalhadora em vez de instrumentos de luta, não vão 
fazer isso. Eles não estão nem aí para os trabalhadores 
demitidos. 

Nossa classe deve ser unida. Não devemos aceitar 
nenhuma demissão por cortes. Amanhã pode ser um de 
nós. Devemos exigir a diminuição das horas de trabalho, 
sem diminuição de salário, para reintegrar os demitidos. 
São os patrões que tanto lucraram nos últimos anos que 
tem que pagar pela crise do seu sistema. Também devemos 
exigir a abertura dos arquivos de contabilidade para 
revelar a fortuna que os grandes capitalistas estão 
fazendo em cima do suor dos trabalhadores. No caso 
de fábricas falidas ou que queiram fechar as portas por 
completo, como o recente caso da MABE (em Campinas 
e Hortolândia) a ocupação, acompanhada do controle 
operário, deve ser a tática da classe trabalhadora. São 
necessárias ações de solidariedade da classe trabalhadora 
em todo o país para fortalecer esses companheiros. 

Terceirização 

Apesar de Dilma não ter falado do Projeto de Lei 
da terceirização (PL 4330/2004), esse é uma importante 
medida na qual os patrões estão apostando para amenizarem 
suas contas nesses tempos de recessão e garantirem 
maiores lucros no próximo ciclo de ascenso econômico. 
Se aprovado e sancionado, ele permitirá que muitos postos 
de trabalho hoje regidos pela CLT (com pisos salariais e 
direitos trabalhistas conquistados a duras penas) passem 
para a lógica da terceirização, que implica menores 
salários, menos direitos e constante instabilidade. 

Não é a toa que Dilma não tenha mencionado esse 
PL. A resposta do PT ao mesmo no ano passado foi muito 
fraca e contraditória, pois ao mesmo tempo em que a 
CUT realizou certa mobilização contra sua aprovação na 
Câmara e que os deputados do PT votaram contra o mesmo 
(ou se abstiveram), o Planalto Central - comprometido 
até o pescoço com o “ajuste fiscal” então promovido por 


Joaquim Levy a pedido de Dilma - se calou. Ademais, 
as mobilizações puxadas pela CUT foram quase que 
simbólicas, pois os burocratas a frente da central sindical 
não fizeram nenhum esforço para realmente parar o país 
com fortes greves. 

Se for aprovado no Senado, esse PL será o mais 
brutal ataque aos direitos trabalhistas desde a ditadura. É 
essencial barrar o mesmo através de lutas unificadas de 
todas as categorias e avançar no sentido de acabar de vez 
com a terceirização, que é uma forma de precarizar a mão 
de obra e dividir a classe) garantido que os trabalhadores 
terceirizados sejam todos integrados às empresas para as 
quais prestam serviços com plenos direitos e isonomia 
salarial. 

Ajuste fiscal 

Dilma também deixou claro que vai continuar o 
ajuste fiscal -agora a cargo dopetistaNelsonBarbosa- que 
significa jogar o custo da crise nas costas dos trabalhadores 
através de corte de gastos públicos e aumento de impostos. 
Os impostos vão ser mais pesados sobre os trabalhadores, 
já que incidem sobre consumo ao invés da renda. Os cortes, 
também. Só para dar um exemplo: a conta de luz teve novo 
reajuste em novembro, depois de já ter aumentado 48% em 
2015. Mas os grandes consumidores, as indústrias, tiveram 
desconto! 

Só no ano passado, Dilma vetou o reajuste dos 
servidores, suspendeu concursos públicos, cortou 7 
bilhões da Educação (provocando uma longa greve 
nacional nas Instituições de Ensino Superior, que acabou 
deiTotada), quase 4 bilhões da Saúde, 10 bilhões do Bolsa 
Família, dentre outras medidas. Mas nem pensar em 
cancelar os pagamentos da “dívida pública” aos credores 
internacionais, grandes banqueiros e empreiteiras. Estes 
continuam lucrando e recebendo o dinheiro dos nossos 
impostos pelos serviços (superfaturados) e empréstimos a 
juros altíssimos feitos ao governo brasileiro. Reafirmando 
seu compromisso para com os credores, Dilma 
recentemente vetou a auditoria dessa dívida, que muitos 
especialistas indicam ser falsificada. E olha que a Câmara 
- cuja composição atual tem sido considerada a mais 
conservadora desde a redemocratização - havia aprovado 
tal medida. 

Por sinal, esses cortes não dividem a oposição 
de direita e governo, nem o PMDB e nem o Congresso: 
nisso estão todos juntos contra o povo. Enquanto isso, os 
salários vão se corroendo pela inflação, que está batendo 
o índice de 10% ao ano. Aproxima medida de Dilma será 
uma reforma da Previdência para aumentar o tempo de 
trabalho e reduzir as aposentadorias. No café da manhã, 
ela disse que 

“A reforma da Previdência tem de ser compreendida 

técnica e politicamente. Essa não é uma questão 

desse ou daquele governo e sequer pode ser 


13 


politizada. Têm vários caminhos para o consenso. 
E um deles é o do fator previdenciário móvel, que 
pode ser incorporado à reforma ”. 

“Não politizar” o debate é uma verdadeira piada. É 
preciso formar um movimento independente do governo 
e da burguesia contra os cortes de direitos e o arrocho 
salarial, no qual estejam presentes os partidos, sindicatos, 
associações de classe e de luta contra a opressão. Essas 
organizações de luta devem ter unidade de ação, com greves 
e manifestações para denunciar e combater esses ataques. 
Essa é a maneira de mostrar a força da classe trabalhadora 
contra o governo e deixar claro que não vamos engolir mais 
ataques enquanto os grandes capitalistas seguem lucrando. 
Se o governo alega rombo no orçamento, então devemos 
demandar a taxação progressiva das grandes fortunas. 

Leilões do Petróleo 

Questionada sobre os leilões dos blocos de petróleo 
que foram adiados, Dilma disse que: 

“Ninguém faz leilão de bloco de exploração [com 
o barril do petróleo] a US$ 30 (...) Como faço, em 
2016, com o petróleo a US$ 30, uma concessão 
de 30 anos? (...) Não é o momento. Talvez poços 
menores. Estamos olhando isso em áreas menos 
rentáveis. ” 

Eis uma característica do governo petista: ainda 
quer manter a aparência de que é “independente” dos 
grandes capitais imperialistas e que defende os interesses 
da nação. Talvez um governo ainda mais entreguista não 
se importasse com um “detalhe” como a baixa histórica 
do preço do barril e vendesse agora mesmo o que resta do 
petróleo e gás brasileiro. Mas o governo Dilma diz que vai 
se limitar aos “poços menores” e esperar um aumento 
antes de abrir novamente as portas para as grandes 
empresas estrangeiras. Pura retórica. Em 2013, a Agência 
Nacional do Petróleo realizou grandes leilões onde deu às 
empresas privadas (em sua maioria europeias, canadenses 
e americanas) o direito de explorar os blocos de poços 
profundos por trinta e cinco anos. 

Dilma fez demagogia prometendo reverter os 
royalties (o imposto anual pelo direito de exploração) para 
saúde e educação. O que não falou, porém, foi que esses 
impostos, assim como o preço de venda, são uma fatia 
minúscula do que essas empresas vão lucrar explorando 
seus trabalhadores e os recursos naturais do país. 

Vejamos, como exemplo, o Campo de Libra, situado 
na costa do Rio de Janeiro, que é a maior reserva de petróleo 
descoberta até hoje no Brasil (8 a 12 milhões de barris). O 
campo foi vendido por 1 5 bilhões de dólares a um consórcio 
reunindo a Petrobras e as empresas Total (França) e Shell 
(Inglaterra e Holanda), além da participação menor de 
duas estatais chinesas. Ora, mesmo se considerarmos o 


preço atual do petróleo, a exploração renderia cerca de 
300 bilhões de dólares. Na época do leilão, a presidente 
mandou o exército, que supostamente deveria “defender 
os interesses do país de ameaças externas”, atacar os 
manifestantes que protestavam contra esse absurdo. 

O valor dos royalties varia com o preço do barril. 
Por isso, a queda no preço fez cair a arrecadação e deixou 
os estados produtores, como o Rio de Janeiro, em grave 
situação orçamentária (já que a maior parte do orçamento 
já é usada para bancar isenções de impostos a empresas 
privadas). O governador Pezão (PMDB) - da base aliada 
do governo e escudeiro de Dilma - é claro, não pensou 
duas vezes antes de cortar da saúde e da educação. Os 
servidores estaduais do RJ tem sofrido com constantes 
atrasos de salários e com o não pagamento de seu 13° 
salário. Os trabalhadores terceirizados de empresas que 
prestam serviços para hospitais, universidades e órgãos do 
estado estão em situação ainda pior. 

Para resolver essa situação, nós trabalhadores 
devemos exigir a reestatização da Petrobras e a 
expropriação sem indenização das companhias privadas 
nacionais e estrangeiras, sob controle dos trabalhadores. 
Com isso, a produção pode realmente voltar seus recursos 
para saúde, educação e investimento em energias limpas. 
Os petroleiros têm um tremendo potencial de luta e, junto 
com o restante da nossa classe, são muito mais capazes 
de defender os interesses do povo do que o governo 
entreguista de Dilma. Se somarem forças aos servidores 
estaduais que já se encontram em luta, como no caso do 
RJ, podem fortalecer imensamente a batalha para que 
sejam os patrões a pagarem pela crise. 

Manifestações 

Dilma foi questionada pelos jornalistas sobre as 
manifestações deruaque estavamacontecendonasprincipais 
cidades do país contra o aumento das tarifas dos transportes, 
especialmenteemSãoPaulo.Elateveacaradepaudeafirmar: 

“Acho que, no nosso caso, conquistamos a 
democracia, e ela tem de ser cuidada e suas regras 
respeitadas (...). As manifestações, nós aprendemos 
a conviver e a respeitá-las. Acho que tratar das 
questões da democracia, as manifestações são uma 
prática normal. ” 

Dilma fingiu que não viu a repressão brutal da 
polícia militar paulista contra os manifestantes nos últimos 
dias. Nem as agressões criminosas da polícia contra os 
vitoriosos estudantes secundaristas que lutaram para que 
suas escolas não fossem fechadas no fim de 2015. E pelo 
visto “esqueceu” que partiu do Executivo o projeto de lei 
que tipifica atos e grupos “terroristas”, um adicional jurídico 
importante para garantir a repressão aos movimentos 
sociais durante as Olimpíadas de 2016, tal qual ocorrera 
com a “Lei Geral da Copa” em 2014 (também iniciativa do 


14 


Planalto Central). [O PL “antiterrorismo” foi sancionado 
por Dilma no mesmo dia em que o PT convicou um ato 
“em defesa da democracia”.] Quando grupos e partidos da 
oposição de direita organizaram protestos no ano passado, 
a polícia posou para fotos e os tratou com gala. Mas diante 
dos que lutam contra as medidas dos governos para piorar 
nossa vida, a resposta é com os porretes e bombas. Diante 
de tudo isso, Dilma comia uma fatia de queijo e falava que 
“aprendemos a conviver”. 

Devemos reivindicar o fim da polícia militar 
e outras forças de repressão contra os movimentos 
sociais. Precisamos defender o direito de manifestação, 
um direito democrático cada vez mais cerceado pelos 
governos. E também exigir a queda de todos os processos 
contra os lutadores das causas populares, inclusive os 
23 criminalizados por protestar durante a Copa do Mundo 
de 2014. As organizações dos trabalhadores devem se 
defender contra as agressões policiais, que ocorrem diante 
de qualquer greve ou movimento combativo. 

Impeachment 

Por fim, Dilma também comentou o processo de 
impeachment lançado contra ela no fim do ano passado. 
Afirmou que 

“Não se pode, no Brasil, achar que você tira um 
presidente porque não está simpatizando com ele. 
Isso não é nem um pouco democrático, achar que 
você tira um presidente porque, do ponto de vista 
político, você também não gosta dele. ” 

E a isso que Dilma resumiu o impeachment: não gostar 
dela e do seu governo. Não está muito longe da verdade, já 
que, como visto, existe um amplo acordo entre os partidos 
da burguesia sobre as medidas de ajuste a serem tomadas. 
Nessas questões centrais, o governo do PT-PMDB pouco 
diverge da oposição de direita. Mas esta oposição de 
direita, junto a uma ala do PMDB, gostaria de ter controle 
direto sobre o Executivo. 

O motivo imediato para o início do processo foi 


o rompimento do presidente da Câmara dos Deputados, 
Eduardo Cunha, com o governo. Cunha, um fundamentalista 
evangélico homofóbico e machista, contra quem pesam 
acusações fortíssimas de aceitação de propina e que possui 
uma conta não-declarada com milhões de dólares na Suíça, 
vinha sendo blindado pelo governo. Como deputados do 
PT votaram pelo encaminhamento das investigações contra 
ele, Cunha contra-atacou. Além dessa disputa sórdida, 
podemos esperar que um governo do PMDB vai ter ainda 
menos pudores que o PT em acelerar o ajuste fiscal. O PT, 
afinal, ainda mantém uma relação com burocratas sindicais 
que precisam enganar suas bases. 

Nós, trabalhadores, devemos nos posicionar contra 
esse impeachment. Não por querer a continuidade do 
governo de Dilma. Estamos também contra os movimentos 
que blindam Dilma e pedem a continuidade de seu governo, 
pois escondem todos os ataques realizados contra nós e as 
alianças espúrias que ela ainda mantém com o PMDB. Mas 
o impeachment é uma maquinação de partes do PMDB e 
da oposição PSDB/DEM para se aproveitar do desgaste 
político do governo. Se chegarem ao poder, vão continuar 
as medidas de ajuste e repressão de forma igual, ou pior. 
Nada temos a ganhar com esse impeachment. Por isso, 
devemos denunciar aqueles que o defendem. 

Os capitalistas e seus governos (como é o governo 
Dilma) fazem de tudo para salvar seu sistema decadente, 
nos oprimindo e explorando cada vez mais. Querem nos 
arrancar tudo. Mesmo as minúsculas reformas realizadas 
pelo PT nesses 12 anos de governo encontraram um ódio 
raivoso das classes dominantes. Mas este governo cumpriu 
sempre as determinações da burguesia e nunca lhe faltou 
quando foi necessário. As reivindicações que apresentamos 
ao longo desse texto apontam para a necessidade de os 
trabalhadores tomarem para si o poder econômico e político. 
Para melhorar significativamente nossas condições de 
vida, para mudar os rumos destrutivos do capitalismo 
em uma direção racional, precisamos de um governo dos 
trabalhadores da cidade e do campo, baseado em nossas 
organizações de luta. Como comunistas revolucionários, 
defendemos que esta é a única maneira de acabar com a 
exploração e a opressão que nos atingem. 


EM NOSSO SITE 

Confira online alguns outros materiais do Reagrupamento Revolucionário 

A Frente Comunista dos Trabalhadores: um ótimo exemplo de como NÃO se 
deve construir um partido, de setembro de 2015: http://tinyurl.com/hrnslvq 

Materiais sobre a greve das universidades públicas (2015): 

http : / / tinyurl.com/ q9j v8yx 
http : / / tinyurl.com/h5vxqp5 



15 


Os vaivéns centristas da Fração Trotskista 

Da FIT argentina ao #MRTnoPSOL 


Rodolfo Kaleb, novembro de 2015 



Há cerca de dois anos, publicamos uma longa 
polêmica com a Fração Trotskista [ 1 ], organização 
internacional do PTS argentino e cuja seção no Brasil é o 
MRT (antiga LER-QI) [ 2 ], Essa polêmica tratava da 
construção do partido revolucionário e do que, para nós, 
consiste na estratégia centrista da Fração Trotskista 
nesse terreno: apostar na aproximação e no amálgama 
com correntes oportunistas da “família do trotskismo”. 
Essa postura se revela nas suas publicações, ao longo dos 
anos, de recorrentes chamados de unidade endereçados 
a vários grupos revisionistas. Nessas publicações da FT, 
geralmente são ignoradas ou minimizadas as muitas vezes 
em que esses grupos renegaram a independência de classe 
e os princípios do marxismo. 

Conforme discutimos a fundo em tal polêmica, a 
FIT (Frente de Esquerda e dos Trabalhadores) da Argentina 
tem sido 0 principal cenário para aplicação dessa política 
pelo PTS nos últimos anos. A FIT é uma coalizão eleitoral 
entre o PTS e duas outras organizações que reivindicam 0 
trotskismo - 0 Partido Obrero (PO) e a Esquerda Socialista 
(IS - seção argentina da corrente morenista UIT). 

Reco nh ecemos que a FIT não é um bloco de 
colaboração de classes, se diferenciando, portanto de uma 
“frente popular” com partidos burgueses. Dessa forma, 
em casos específicos, 0 apoio eleitoral crítico à FIT seria 
válido. Por outro lado, ela também não é, diferentemente 
do que a FT afirma em certas ocasiões (e nega em outras), 
um mero bloco eleitoral com 0 propósito limitado de 
viabilizar candidaturas proletárias nas eleições burguesas. 
Porém, como demonstramos naquela polêmica, 0 PTS 
pretende da FIT um trampolim para a unidade política com 
as outras correntes, especialmente 0 Partido Obrero de 
Jorge Altamira. O PTS frequentemente pressiona os outros 
grupos para manter essa unidade para além das eleições, na 


forma de uma frente permanente. De forma emblemática, 
reiteradas vezes 0 PTS e 0 MRT afirmaram encarar a FIT 
como uma “frente revolucionária”, como um embrião de 
um partido revolucionário. 

Desde que escrevemos nossa crítica, tivemos muitas 
conversas com militantes da Fração Trotskista no Brasil 
(então organizados na LER-QI) sobre esse assunto. Uma 
resposta que comumente recebemos foi de que a intenção 
do PTS não era se aproximar dos grupos revisionistas, mas 
que a FIT era uma “frente única”, uma simples colaboração 
prática, com 0 objetivo de superar a legislação eleitoral 
restritiva da Argentina, e concorrer às eleições com uma 
chapa classista. Significativamente, essa posição já foi 
divulgada pela seção alemã da Fração Trotskista, conforme 
apontamos em nossa polêmica anterior [ 3 ]. Certamente 
que não haveria nada de errado com isso, não fossem 
as afirmações claras do próprio PTS de que a FIT não 
é isso. Recentemente, a FIT tem passado por uma dura 
divisão em relação à formação da chapa para as eleições 
presidenciais. Nesse contexto, aqui está uma resposta da 
liderança do PTS à afirmação de Altamira (PO), feita no 
fim do ano passado, de que a FIT era uma “frente única”: 

“A FIT é um bloco de agitação de três partidos que se 
reivindicam trotskistas que defendem um programa de 
reivindicações transitórias, a independência da classe e 
propõem um governo dos trabalhadores. Isso não é uma 
frente única’, e sim um reagrupamento de formações 
de esquerda que se reivindicam revolucionárias que 
ainda não são partidos grandes e seu objetivo é agitar 
um programa revolucionário em comum nos processos 
eleitorais. O programa da FIT, mais que 0 de ‘frente 
única’, abre 0 caminho para 0 debate da necessidade 
de um partido revolucionário, proposta que temos feito 


esquerdadiario.com.br 



16 


em várias oportunidades e à qual os nossos aliados 
lamentavelmente tem se negado sistematicamente.” 
(nossa ênfase) 

O Partido Obrero no Luna Park e o discurso de Jorge 
Altamira, 9 de novembro de 2014. Disponível em: 
http://tinyurl.com/ofbu7tt 

Essa declaração da liderança do PTS deixa explícito 
aquilo que dizíamos, e que alguns militantes da FT 
sempre negaram: que a atuação do PTS na FIT é buscar 
a unidade, uma aproximação política, com correntes 
reconhecidamente oportunistas. 

Outra resposta (verbal) que recebemos à nossa 
polêmica foi o reconhecimento de que, sim, a Fração 
Trotskista faz convites para discussões de unidade a 
essas correntes oportunistas (o que fica evidente lendo 
a citação acima). Mas que isso nada mais seria que uma 
“tática” para incidir sobre a base desses grupos. Ou seja, o 
objetivo seria mostrar que o PTS não se recusa ao debate, 
que não é um grupo sectário. Isso implicaria que a FT não 
pretende, de fato, unidade com os grupos que corteja, mas 
que afirma isso somente como uma forma de disputar seus 
militantes. 

Temos sérios problemas com essa “explicação”. 
Antes de tudo, porque ela é dissimulada. A “tática” da 
FT seria desonesta com a base das correntes oportunistas 
ao proclamar uma coisa (o desejo de aproximação ou 
discussão de unidade) tendo outro interesse por trás. Além 
do mais, se realmente fosse essa a intenção da Fração 
Trotskista, essa seria uma “tática” muito ruim para o 
propósito de convencer esses militantes. A FT faz muitas 
críticas acertadas às posições oportunistas do PO e dos 
morenistas da Esquerda Socialista. Porém, joga fora a 
sua consistência quando, volta e meia, considera que eles 
“defendem um programa de reivindicações transitórias, 
a independência da classe e propõem um governo dos 
trabalhadores” (como afirma que fazem na FIT). 

Para ganhar a base de um grupo oportunista, 
é necessário demonstrar cabalmente os problemas 
incorrigíveis da sua direção. Afinal, todo militante 
dedicado permaneceria em sua organização (mesmo que 
nela visse problemas e erros) se considerasse que eles são 
solucionáveis. Deve-se explicar calmamente à base dessas 
correntes como a política de seus dirigentes conduz ou 
conduziria o proletariado a derrotas, e não fazer concessões 
ou chamados de unidade. Como disse Trotsky, “Se um livro 
de física contiver, ainda que fosse só duas linhas sobre Deus 
como a causa primeira, estaria no meu direito concluir 
que o autor é um obscurantista ” [4]. De nada adiantam as 
críticas muitas vezes corretas que a Fração Trotskista faz 
a esses grupos oportunistas se ela afirma (em bem mais de 
duas linhas) que os três partidos da FIT (Partido Obrero e 
Esquerda Socialista, além do próprio PTS) defendem um 
“programa revolucionário em comum” e então demanda 
unidade política com os mesmos. 

Quantas vezes esses grupos não cruzaram a 
independência de classe? Vem à mente as várias vezes em 
que o PO apoiou candidaturas burguesas nas eleições [5]. 


Ou quando a IS defendeu a vitória de uma “revolução” 
em unidade com a OTAN na Líbia em 2011 [6]. Em 
2012, o PO levantou no contexto da Grécia a proposta 
de um “governo da esquerda” para assumir o Estado 
burguês [7]. E que dizer então dos morenistas, que viram 
uma “revolução vitoriosa” no Egito enquanto os militares 
subiam ao poder em 2013 [8]? A FT conhece muito bem 
todos esses exemplos, pois os criticou. Portanto, a sua 
afirmação de que esses partidos defendem a “independência 
de classe” e “propõem um governo dos trabalhadores”, é 
uma capitulação centrista. Centrista porque, não obstante 
criticar tais grupos em diferentes ocasiões, são quase que 
periódicos os chamados à construção de organizações 
“revolucionárias” junto com eles, seja no âmbito argentino, 
via PTS, seja internacional. Veja-se esse exemplo de 
chamado do PTS, de 2009: 

“Na Argentina, o PTS está chamando as correntes 
trotskistas que não adotaram a política de dissolver-se 
ou de aliar-se com setores da centro-esquerda (como 
o Partido Obrero e aquelas que, como a Esquerda 
Socialista e o MAS, nas últimas eleições nacionais 
formaram junto com o PTS o FITS) a abrir a 
discussão para avançar na construção de um partido 
comum marxista revolucionário, com centralismo 
democrático, que supõe a liberdade de tendências, 
e numa intervenção comum na luta de classes, que 
permita mediante a experiência e a discussão, superar 
a dispersão atual das forças que nos reivindicamos do 
marxismo revolucionário.” 

Que partido para qual estratégia?, 23 de fevereiro de 
2009. Disponível em: http://tinyurl.com/nef63aa 

Ou, ainda mais significativa, a campanha 
iniciada pela Fração Trotskista cerca dois anos atrás, 
em prol de um “Movimento por uma Internacional da 
Revolução Socialista” (a qual ela acabou abandonando 
silenciosamente após certo estardalhaço de alguns meses). 
Essa campanha partia de um manifesto onde se chamava 
ao “reagrupamento” uma série de grupos oportunistas sem 
qualquer consistência, baseando-se em posições bastante 
isoladas acerca de uma série de fenômenos importantes 
da luta de classes que então ocorriam mundo afora, em 
especial aqueles relacionados à “Primavera Árabe” e à luta 
de classes na Grécia: 

“Chamamos especialmente os companheiros do Novo 
Partido Anticapitalista (NPA) da França, tanto os que 
integram conosco a ‘Plataforma Z’ como aqueles que 
se agrupam na ‘Plataforma Y’ (...) e os companheiros 
do ex-Secretariado Unificado (SU) de outros países que 
enfrentam a orientação majoritária de generalizar este 
tipo de blocos com reformistas (...); os companheiros 
do Partido Obrero da Argentina e a Coordenação pela 
Refundação da Quarta Internacional (CRCI), com 
quem integramos na Argentina a Frente de Esquerda dos 
Trabalhadores (FIT) e temos coincidido em diversos 
fatos da luta de classes nacional e internacional; os 
grupos da esquerda trotskista grega que combatem a 
adaptação ao Syriza; e a todas aquelas organizações 


17 


da esquerda revolucionária ou da vanguarda operária 
e juvenil que busquem o caminho à revolução.” 
Manifesto por um Movimento por uma 
Internacional da Revolução Socialista , agosto de 
2013. Disponível em: http://tinyurl.com/qetl3tn 
Em todos esses casos, a Fração Trotskista dizia 
querer construir um partido conjunto com as organizações 
revisionistas do trotskismo. Para nós, diferente das duas 
supostas explicações que mencionamos acima para esses 
chamados de aproximação e de unidade, há uma terceira 
que realmente faz sentido. 

Alguns dirigentes da FT parecem compreender 
essas propostas como um tipo de “manobra”. Porém, 
essa manobra não pode ter a intenção de disputar a base 
das correntes oportunistas, pois o efeito só poderia ser 
enfraquecer suas críticas diante desse público, conforme 
explicamos. Essa manobra se destina aos próprios 
dirigentes dos grupos oportunistas, com o objetivo de atrair 
essas correntes a uma aproximação. Daí o seu formato 
mais comum ser uma carta ou carta aberta, com a intenção 
de pressionar os dirigentes a debater o assunto. Por sua 
vez, muitos militantes da Fração Trotskista ou ignoram 
a existência desses chamados ou são convencidos pela 
desculpa de que se trata de “táticas” para disputar a base 
dos centristas. 

Os líderes da FT estão errados em achar que 
podem manobrar ou influenciar os dirigentes de grupos 
oportunistas a uma fusão onde seu programa tenha alguma 
chance de prevalecer. Via de regra, esses dirigentes são 
muito pouco ingênuos e bastante experientes nesse tipo 
de jogada. Além disso, fazer essa aposta implica também 
acreditar na capacidade desses dirigentes de efetivamente 
assumir o programa do marxismo revolucionário, ainda 
que sob algum tipo de indução ou pressão, o que é uma 
ilusão. Como apontamos em nossa polêmica de dois anos 
atrás, essa era precisamente a expectativa dos velhos 
pablistas com relação aos stalinistas e reformistas, com 
a diferença de que a FT quer fazer isso com grupos da 
“família trotskista”. 

Hoje o PO argentino, ontem o PSTU brasileiro 

Se hoje em dia o PTS faz elogios e propostas de 
unidade ao PO/IS, enaltecendo a FIT enquanto um bloco 
com um “programa revolucionário em comum”, quase 
dez anos atrás a FT preferia fazer isso com os morenistas 
do PSTU brasileiro. Daí a “carta aberta aos militantes do 
PSTU e da FIT”, que eles publicaram em 2006: 

“Nossa corrente, assim como a FIT, vem 
corretamente criticando o giro à direita da maioria 
das correntes do trotskismo internacional, fenômeno 
que vocês chamam de ‘vendaval oportunista’. (...) 
Recentemente, o PO dá passos no mesmo caminho 
e chama a votar na Frente Popular de Evo Morales 
na Bolívia, e depois, em Romano Prodi na Itália. 
Consideramos que, assim como nós, os companheiros 
do PSTU e da FIT tiveram o mérito de não cometer 


nenhuma dessas capitulações citadas e são esses 
acordos políticos que nos levam a propor abrir uma 
discussão nacional e internacional.” 

Carta aberta aos militantes do PSTU e da LIT, 5 
de maio de 2006. Disponível em: http://tinyurl. 
com/opzzca6 

Isso só mostra que não se trata de um fenômeno novo 
ou isolado. Em 20 14, os companheiros daFT aparentemente 
haviam “se esquecido” dessas posições oportunistas do PO 
e afirmaram que ele defendia a independência de classe 
e um governo de trabalhadores. Em 2006, por sua vez, a 
antiga FER-QI “se esquecia” de toda a história oportunista 
do morenismo, seu apoio também recorrente a frentes 
populares com a burguesia, incluindo o PT brasileiro, 
que o PSTU havia apoiado eleitoralmente apenas quatro 
anos antes [9]- A então FER-QI via “acordos políticos 
que nos levam a propor abrir uma discussão nacional e 
internacional” com os morenistas. 

Certamente as intenções da FT foram frustradas com 
o giro à direita no próprio PSTU, que nos últimos anos 
apoiou uma série de quedas de governo hegemonizadas 
por partidos burgueses ou pelo próprio imperialismo 
como supostas “revoluções democráticas vitoriosas” 
(Fíbia, Ucrânia, duas vezes no Egito). Mas podemos 
seriamente esperar que esses chamados de unidade não 
voltarão a se repetir diante de um realinhamento político? 
Os revolucionários precisam ser a “memória política” da 
vanguarda proletária para orientá-las diante das armadilhas 
reformistas e oportunistas. Mas nesse caso, a FT não 
lembrava (ou melhor, fingia não lembrar - o que é ainda 
pior) do que eles próprios escreveram. 

Há algo de novo na criação do MRT? 

A recente transformação da FER-QI em MRT 
indicou uma intenção em realizar um giro de massas, 
dando um salto qualitativo em sua situação organizativa, 
a qual ainda era em grande parte a de um grupo de 
propaganda. Isso implicou também a transformação do 
site da organização num portal de notícias mais amplo, 
o Esquerda Diário. [10] 

Em seu congresso (julho passado), o MRT deu uma 
nova forma a esse giro através de sua decisão de pedir o 
ingresso no PSOF. Depois dos últimos resultados eleitorais 
do PSOF, o MRT considerou-o como “um partido que pode 
expressar crescentemente parte importante das tendências 
de massas que se desenvolverão à esquerda da crise do 
PT” [11], Ao pedir sua entrada à direção do partido, o MRT 
fez algumas críticas ao rumo que ela tem tomado, apontando 
como tem sido incapaz de tirar vantagem do enorme desgaste 
do PT com a classe trabalhadora e outros setores populares, 
e expressando em seguida o desejo de tomar-se uma 
tendência interna com liberdade programática. A direção 
do PSOF recusou a entrada do MRT até esse momento, 
apontando que ela só poderia dar-se por aprovação do 
congresso partidário em 2016, o que o MRT denunciou 
como antidemocrático. Isso fez com que lançasse uma 


18 


campanha pelas redes sociais com o slogan #MRTnoPSOL. 

Não há nenhuma questão de princípios que impeça 
a entrada (temporária) de organizações que se reivindicam 
revolucionárias em partidos reformistas mais amplos, 
como uma tendência de esquerda. Os trotskistas europeus 
e americanos, por exemplo, realizaram nos anos 1930 
um movimento (que ficou conhecido como “entrismo”) 
de adesão organizativa aos partidos socialdemocratas de 
massas, que recentemente haviam ganho muitos setores 
jovens e radicalizados da classe trabalhadora. Somos 
contra a crítica ultraesquerdista que considera qualquer 
tática dessa natureza como uma “traição” imediata. 

Porém, é inegável que há entradas oportunistas, 
assim como revolucionárias. O objetivo dos trotskistas 
com táticas de entrada é polarizar um setor ao redor do 
programa revolucionário para posteriormente construir 
um partido marxista independente. Nisso, como sempre, é 
preciso plena independência programática do oportunismo. 
Um exemplo pela negativa é a atuação de muitas correntes 
da ala de esquerda do próprio PSOL (algumas das quais 
se reivindicam trotskistas). Apesar de criticarem os passos 
mais abusivos da direção desse partido em questões 
de falta de democracia interna e posturas oportunistas 
de colaboração de classe (dentre as quais está, mais 
recentemente, de querer fazer uma “frente de esquerda” 
com o PT/PCdoB e outros partidos burgueses [12] [ver 
o ADENDO ao final deste artigo para os fatos mais 
recentes]), acabam se adaptando a uma convivência com 
tal direção. 

As principais correntes que compõem o “bloco 
de esquerda” do PSOL chamaram a votar na candidata 
do partido, Luciana Genro, mesmo sabendo que ela 
havia recebido financiamento de campanha de empresas. 
Também fazem elogios e uma verdadeira tietagem com 
figuras parlamentares como Marcelo Freixo, cujas posições 
políticas passam longe de qualquer ideal socialista. Veja-se 
o “apoio crítico” que Freixo deu ao projeto das UPP e a 
propaganda eleitoral que fez para Dilma no segundo turno 
das eleições em 2014. 

O que surpreende na decisão do MRT de entrar no 
PSOL é porque se dá num momento em que nenhum setor 
combativo da juventude ou da classe trabalhadora brasileira 
caminha em direção a esse partido. Os movimentos de 
“entrismo” originais foram motivados por uma grande leva 
de militantes radicais (assim como de jovens e interessantes 
grupos centristas) que adentravam a socialdemocracia. 
Nenhum movimento desse tipo existe no PSOL brasileiro 
nesse momento. 

O crescimento eleitoral (pouco expressivo) do PSOL 
foi o principal argumento usado pelo MRT para sua decisão. 
Mas esse resultado não implicou, nem necessariamente o 
fará, nenhuma perspectiva de crescimento qualitativo do 
seu corpo militante (em número e em radicalidade política), 
que é o que interessa para construção do partido. As 
correntes que se reivindicam “trotskistas” no PSOL estão 
adaptadas à direção do partido, conforme ficou patente 
com o seu respeito à disciplina partidária mesmo depois 


que o último congresso foi ganho com base em delegados 
eleitos ffaudulentamente pela corrente majoritária de 
Randolfe Rodrigues. 

Impressiona também a mudança de tom do MRT 
comrelação ao PSOL. Em dezembro de 2013, a então LER- 
QI afirmava com bastante certeza que, embora pudesse 
crescer eleitoralmente, o PSOL só poderia aprofundar 
o seu eleitoralismo, que era “incapaz de romper com a 
tradição petista”: 

“O PSTU faliu como alternativa revolucionária, 
e o PSOL.... nunca se colocou essa perspectiva. 
Quando dizemos que faliram, não quer dizer que 
não podem até vir a crescer (coisa que não se 
deu qualitativamente pós junho), por exemplo, 
capitalizando eleitoralmente (nas eleições 
burguesas, mas também nos sindicatos) a mudança 
da consciência das massas pós junho. Mas isso 
se dará aprofundando os problemas que aqui 
apontamos, pois não poderão resistir às pressões de 
adaptação, como se expressou cm junho, pois fazem 
parte de uma tradição arraigada. (...) E seguirá 
sendo assim, pois são incapazes de romper com a 
tradição petista, o que só poderia se dar fazendo 
uma ruptura com sua própria tradição, marcada pelo 
sindicalismo e eleitoralismo.” 

O PSOL e o PSTU não passaram a prova de junho, 
11 de dezembro de 2013. Disponível em:http:// 
tinyurI.com/obadk2y 

Agora, parece que é fundamental que o PSOL 
“concentre forças” a favor da classe trabalhadora, o 
que é apresentado com uma aposta válida, na qual os 
revolucionários deveriam colocar esforços: 

“Para que a luta dos trabalhadores seja consequente, 
é necessário que o PSOL, com seus militantes e 
parlamentares, concentre forças a favor das lutas e da 
organização da classe trabalhadora e da juventude, 
abrindo portas para as organizações revolucionárias 
que queiram fazer parte dessa perspectiva.” 
Manifesto do MRT em campanha pelo 
#MRTnoPSOL, 6 de agosto de 2015. Disponível 
em: http://tinyurl.com/og75csl 
E claro que não há como saber de antemão como 
será (caso seja concretizada) a atuação da tendência do 
MRT no PSOL. Mas com base na sua estratégia centrista 
de buscar unidade com correntes oportunistas, imaginamos 
que não se daria no sentido de polarizar um setor do 
partido contra a direção (e de forma independente do 
atual “bloco de esquerda”). Ao contrário, podemos prever 
chamados de unidade a certas correntes revisionistas da 
“família trotskista” da esquerda do partido, semelhantes 
aos que a Fração Trotskista já faz regularmente do 
lado de fora. Inclusive, uma das correntes do “bloco 
de esquerda” do PSOL é a morenista CST (Corrente 
Socialista dos Trabalhadores), organização irmã da IS 
argentina à qual o PTS já endereça os seus chamados. 

Apesar do seu novo nome, o MRT brasileiro é 
herdeiro dessa política, já que nunca fez uma crítica à 


19 


mesma, demonstrando claro alinhamento com a linha 
centrista da direção internacional da FT. Assim como todos 
os centristas que oscilam entre uma política pretensamente 
revolucionária e posições abertamente oportunistas, 
também a FT realiza vaivéns na sua posição em relação 
aos grupos revisionistas do trotskismo. Ora crítica 
acertada, ora capitulação e desejo de unidade. Mas não se 
pode reconstruir a Quarta Internacional com “manobras” 
desse tipo. Somente uma crítica certeira e consistente ao 
oportunismo pode avançar para a reconstrução do partido 
mundial da revolução socialista. 

ADENDO 

Desde que a versão preliminar deste artigo ficou 
pronta, o PSOL formou a “Frente Brasil sem Medo”, em 
conjunto com o MTST e setores govemistas do PT e do 
PCdoB, organizados na CUT, na CTB, na UNE, e em outros 
agrupamentos menores. O objetivo dessa frente seria o de 
enfrentar as medidas de austeridade do governo e a ameaça 
de impeachment que a direita está lançando contra ele, mas 
blindando Dilma e o PT, ao focar as críticas somente em 
Levy (como se fossem coisas diferentes!). Em resposta a 
esse giro à direita por parte do PSOL, o MRT deixou de 
lado a postura mais “branda” que vinha adotando e lançou 
duras críticas ao partido [ 13 ] . Ademais, parece ter removido 
de sua agitação cotidiana a campanha #MRTnoPsol, que 
vinha priorizando em sua atuação pública. Não podemos 
prever de antemão se o MRT irá manter o pedido de 
entrada no PSOL ou se presenciaremos um novo zigezague 
na orientação política dessa organização, mas está clara a 
confusão que gera a sua orientação estratégica que aqui 
criticamos. 

NOTAS 

[ 1 ] Fração Trotskistaesuarupturaincompletacomomorenismo (maio 
de 2013). Disponível em: http://tinyurl.com/nkbz9bl 

[ 2 ] Nós do Reagrupamento Revolucionário possuímos com 
as companheiras e companheiros do MRT outras diferenças 
estratégicas que nos separam. Desde 2013, algumas de nossas 
diferenças políticas se aprofundaram ou se mantiveram, sobretudo 
com relação à política nos processos de guerra civil e intervenção 
imperialista no Oriente Médio e Norte da África (caso da Líbia e da 
Síria), onde observamos um abandono do princípio de defesa das 
nações oprimidas e uma aproximação com o oportunismo morenista 
de apoiar setores desse processo independentemente de seu 
conteúdo de classe. Veja Os rebeldes na Líbia e na Síria e a posição 
revolucionária (janeiro de 2014), disponível em http://tinyurl.com/ 
oubqhar . E também em questões nacionais, como quando a então 
LER-QI chamou “voto crítico” no PSTU “onde este partido não 
estivesse coligado com o PSOL” (nacionalmente). Isso sendo que o 
PSTU estava coligado com o PSOL nos principais estados do país, 
inclusive em São Paulo e, no Rio Grande do Sul, onde era parte de 
uma campanha que recebeu dinheiro de financiamento capitalista. 
Veja Os comunistas e as eleições de 2074(setembro de 2014), 
disponível em: http://tinyurl.com/oh34asr . 

[3] ‘ ‘Outra característica importante para a formação da FIT é a 
questão de frentes eleitorais como uma frente única temporária 
baseada em acordos parciais em uma situação concreta, em oposição 
a projetos de longo prazo, baseados em acordos mais profundos 
em termos de programa, estratégia e prática. A FIT não é de forma 


alguma um projeto que foi designado em termos de um alinhamento 
de longo prazo do PTS com o PO, mas sobre a necessidade 
concreta de uma frente única dos trabalhadores contra a repressão 
burguesa...”. (A campanha eleitoral da FIT na Argentina, 27 de 
julho de 201 1, disponível em inglês em: http://tinyurl.com/no6ebjg) 

[ 4 ] De um arranhão ao perigo de gangrena (janeiro 
de 1940). Disponível em: http://tinyurl.com/pwue93x 

[ 5 ] Conforme nossa crítica em PCO, Partido 

Obrem e as frentes populares (fevereiro de 
2013). Disponível em: http://tinyurl.com/n9r9zbg 

[ 6 ] La revolución árabe y el final de Kadafi. Disponível 
em: http://tinyurl.com/p8twb53 Para nossa crítica à posição 
semelhante tomada pelo PSTU brasileiro, ver PSTU, Fração 
Trotskista e a defesa da Líbia contra o imperialismo (novembro 
de 2011), disponível em:http://tinyurl.com/od7f3e5 

[ 7 ] La pulseada entre el FMI y Syriza. Disponível em: http:// 

tinyurl.com/ngbjezc Para a crítica publicada pelo PTS 
argentino, ver Los revolucionários y la cuestión dei “gobierno 
de izquierda ”, disponível em: http://tinyurl.com/oao8toq 

[ 8 ] Egipto: la movilización revolucionaria derribó a 

Mursi! Disponível em: http://tinyurl.com/pac6u7n Para nossa 
crítica à posição semelhante tomada pelo PSTU brasileiro, 
ver O golpe militar no Egito e a posição escandalosa do PSTU/ 
LIT (outubro de 2013), disponível em: http://tinyurl.com/o6vjpnh 

[ 9 ] PSTU chama voto em Lula (outubro de 2002). Disponível 

em: http://tinyurl.com/heqq6pr. Para uma crítica nossa à 
prática do morenismo e do PSTU em apoiar frentes populares, 
ver PSTU ' justifica ” seu bloco com PSOL e PCdoB (agosto 
de 2012), disponível em: http://tinyurl.com/qbau88k. 

[ 10 ] O MRT está claramente experimentando neste giro. Pouco antes 
da mudança de nome, havia dado um tom muito mais superficial aos 
materiais publicados em seu jornal Palavra Operária - um clássico 
erro em tentar atingir as massas reduzindo o programa, contra o 
qual Trotsky advertira seus camaradas franceses em 1935 (em 
um texto que recomendamos fortemente aos membros do MRT e 
do qual citamos abaixo um trecho). Depois, extinguiram o jornal 
impresso para lançar o portal de notícias online Esquerda Diário, 
tendo apenas recentemente voltado com uma versão impressa 
do Palavra Operária, dessa vez com um tom mais parecido com 
o original, com matérias se diferenciando de grupos adversários e 
fazendo polêmicas. 

“Mas, muito frequentemente, a impaciência revolucionária (que 
facilmente se transforma em impaciência oportunista) leva à 
seguinte conclusão: as massas não vem até nós porque nossas ideias 
são complicadas demais e nossas palavras de ordem avançadas 
demais - ou seja, deve-se jogar fora alguns entulhos. Basicamente, 
isso significa: nossas palavras de ordem devem corresponder 
não à situação objetiva, não à relação de classes analisada pelo 
método marxista, mas a obseryações subjetivas (e extremamente 
superficiais e inadequadas) sobre o que as “massas” podem e não 
podem aceitar Mas quais massas? A massa não é homogênea. 
Ela se desenvolve. Ela sente a pressão dos eventos. Ela aceitará 
amanhã o que não aceita hoje. Nossos quadros vão desbravar o 
caminho com crescente sucesso para nossas ideias e palavras de 
ordem, as quais vão se mostrar corretas porque são confirmadas 
pela marcha dos eventos e não por observações subjetivas e 
pessoais. ” (Leon Trotsky, O que é um jornal de massas? Novembro 
de 1935, disponível em http://tinyurl.com/pqou98n) 

[ 11 ] Congresso do MRT aprova proposta de entrada no PSOL, 
20 de julho de 2015, disponível em: http://tinyurl.com/q5466nb. 

[ 12 ] Negociação avança e frente de esquerda 

é batizada de “Grupo Brasil”, 27 de junho de 
2015, disponível em: http://tinyurl.com/heednfd. 

[ 13 ] Uma Frente pra deixar Dilma e o PT sem medo, de 13 de 
outubro de 2015, disponível em: http://tinyurl.com/h9k813v. >. 


20 


Polêmica com a LIT / PSTU sobre a Palestina 

Internacionalismo proletário ou adaptação ao 
nacionalismo burguês? 


Rodolfo Kaleb e Mareio Torres, janeiro de 2015 



Recentemente nós do Reagrupamento 
Revolucionário publicamos uma declaração sobre a 
questão palestina e 0 massacre peipetrado pelo regime 
sionista de Israel contra a população de Gaza. [1] Nessa 
declaração, além de apontarmos nossa oposição em relação 
aos ataques israelenses e a defesa da Palestina de forma 
mais geral, também tecemos algumas breves críticas a 
algumas posições presentes na esquerda que se reivindica 
revolucionária. Esta frequentemente defende uma política 
desorientadora e oportunista sobre tarefas concretas para 
levar à emancipação do povo palestino e a um governo 
dos trabalhadores. Dessa forma, queremos aprofundar 
algumas dessas críticas, mais especificamente as que se 
aplicam ao Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado 
(PSTU) e à organização internacional por ele dirigida, a 
Liga Internacional dos Trabalhadores (LIT). 

Capitulação ao programa e aos partidos nacionalistas 
burgueses 

Comumente, 0 PSTU/LIT resume seu programa 
para a luta de classes na Palestina através do slogan “Ror 
uma Palestina livre, laica e democrática ” (acrescentando, 
às vezes, também “não racista”). Não é acaso que essa 
síntese de sua posição não coloque em questão 0 caráter 
de classe da Palestina que almejam. Analisando de perto 0 
conteúdo desse slogan, vemos que ele se limita ao programa 
original da OLP (Organização pela Libertação da Palestina), 
como 0 próprio PSTU já afirmou explicitamente: 


“Estamos juntos com as massas palestinas, 
libanesas e árabes na defesa da destruição do Estado 
de Israel. Contudo, diferentemente das correntes 
fundamentalistas islâmicas, fazemos esta defesa 
dentro da mesma perspectiva que existia na 
raiz da OLP: a criação de uma Palestina laica, 
democrática e não racista .” 

Pela destruição do “Estado policial ” de Israel, de 
agosto de 2006 . Ênfase nossa, http://www.pstu.org. 
br/intemacional materia.asp?id=5404&ida=0 

Criada em 1964, a OLP começou como uma 
coalização de forças políticas variadas adotando táticas de 
guerrilha, reivindicando 0 fim do sionismo, 0 direito de 
retomo dos palestinos expulsos de suas terras e 0 retomo 
à “Palestina histórica”, isto é, às fronteiras existentes antes 
de 1948. Como acontece com toda organização de massas 
sem uma delimitação classista, a OLP passou rapidamente 
a atender fundamentalmente aos interesses dos setores 
mais favorecidos economicamente da população palestina. 
Logo nos primeiros anos, 0 partido Latah (Movimento 
pela Libertação Nacional da Palestina) dirigido por Yasser 
Arafat tomou-se a liderança da organização, 0 que lhe 
conferiu um caráter político nacionalista, sem nenhuma 
pretensão de confrontar 0 capitalismo. Com 0 tempo, 
esse programa levou à sua conclusão lógica: disposição a 
“negociar” os direitos dos palestinos em troca de alguma 
estabilidade econômica e política para os palestinos 


worldjewishdaily.com 



21 


mais prósperos. Na década de 1980, sob a orientação 
do Fatah, a OLP aceitou negociar com Israel um “mini 
Estado” palestino, que compreendesse a Faixa de Gaza 
e a Cisjordânia, abandonando abertamente as pretensões 
de derrotar o controle do Estado sionista sobre o território 
palestino e reconhecendo a legitimidade deste. 

Qual força política é capaz de construir uma Palestina 
“laica, democrática e não racista”? Para os marxistas, só 
há duas classes na sociedade moderna que são capazes 
de realmente estabelecer seu poder: ou a burguesia ou os 
trabalhadores. A camada bastante frágil dos empresários 
palestinos já demonstrou sua completa bancarrota política 
ao aceitar uma “coexistência” sob o tacão dos sionistas. 
Cabe ao proletariado da região, em aliança com as massas 
camponesas pobres e os oprimidos pelo capitalismo 
sionista, lutar contra esse regime. Mas ao se organizar como 
vanguarda da luta contra o sionismo, o proletariado não irá 
se limitar ao programa democrático da pequena-burguesia. 
Ele vai necessariamente iniciar a construção do seu próprio 
governo, estabelecido sob as bases de expropriação da 
propriedade burguesa, administração democrática das 
empresas e armamento dos trabalhadores. 

Ao reivindicar o programa original da OLP, 
abandonado pelo próprio Fatah em razão dos interesses de 
classe burgueses e pequeno-burgueses que ele representa, 
os dirigentes do PSTU “esquecem” o “detalhe” de que 
uma Palestina realmente “livre, soberana, democrática e 
não racista” só é possível sob um regime de democracia 
proletária, e que isso jamais esteve no programa da OLP 
e nem estará, pois vai contra seu compromisso de manter 
o capitalismo. O resultado é que o PSTU se coloca em 
defesa de um programa pequeno-burguês. Muitos dos 
seus materiais de propaganda sequer colocam a tarefa de 
construção de um poder dos trabalhadores [2], ou colocam 
essa tarefa de forma deslocada da luta (considerada 
prioritária) por uma Palestina “democrática”. Sob essa 
configuração, a Palestina “democrática” defendida pelo 
PSTU seria um regime burguês para substituir Israel. É 
nos próprios partidos da burguesia e da pequena-burguesia 
que o PSTU busca um instrumento para realizar essa 
tarefa. Por muitos anos, chamou para que a OLP liderasse 
o povo palestino e lhe conferiu apoio político praticamente 
acrítico. Mas como nos últimos anos a capitulação da OLP 
ao sionismo ficou explícita demais, foi necessário ao 
PSTU buscar outra força política da qual esperar o objetivo 
utópico da “Palestina livre” sem menção ao caráter de 
classe. Em 2007, em um artigo publicado em seu site, o 
PSTU defendeu a seguinte “alternativa”: 

“Nesse momento é muito importante realizar 
um chamado a todos os que desejam resistir a 
Israel e seus parceiros. O Hamas precisa estar à 
frente desse chamado a todas as organizações da 
resistência palestina, da esquerda e das próprias 
bases do Fatah, a romper com seu corrupto 
presidente e repudiar seu golpe. A paz só virá com 


a luta intransigente e até o fim contra o Estado de 
Israel e a construção de uma Palestina soberana, 
laica, democrática e não racista, com retomo de 
todos os refugiados.” 

Hamas toma controle da Faixa de Gaza, julho de 
2007. Disponível em: http://www.pstu.org.br/ 

jornal materia.asp?id=7020&ida=2 

O Flamas (Movimento de Resistência Islâmica) 
surgiu em 1987 como uma dissidência da Irmandade 
Muçulmana, sendo um partido que defende a construção 
de um Estado teocrático islâmico na Palestina. Em 2007, 
no ano do artigo escrito pelo PSTU, ele chegou ao governo 
da Faixa de Gaza e hoje controla a maioria dos assentos 
no parlamento organizado pela Autoridade Nacional 
Palestina. O Hamas ganhou bastante prestígio com as 
massas palestinas em razão da capitulação gritante da OLP 
ao regime sionista e, devido à situação extrema da Faixa 
de Gaza, ele frequentemente toma medidas de resistência 
armada contra Israel. Contudo, seus interesses nada tem a 
ver com os do proletariado. Não só ele também sustenta o 
capitalismo, como também é abertamente antidemocrático, 
sendo contra os direitos seculares das mulheres da Palestina 
e igualando todos os trabalhadores israelenses com os 
assassinos governantes de Israel. 

Ao chamar para que o Hamas “esteja à frente” de 
toda a resistência palestina, o PSTU conferiu a esse partido 
nacionalista islâmico o “direito” de liderar inclusive os 
trabalhadores palestinos. Indiretamente, está abdicando da 
lutaporumpartidorevolucionárioparaganharoproletariado 
da influência nociva do nacionalismo islâmico, dizendo 
inclusive que é o Hamas que deve chamar a romper a base 
do Fatah. Além do mais, como é possível que os dirigentes 
do PSTU acreditem que o Hamas seja capaz de levar a 
cabo uma luta por um programa que ele jamais teve, ou 
mesmo que seja possível que seus membros lutem por uma 
Palestina “laica” (sendo defensores da teocracia islâmica), 
“livre e soberana” (sendo que estão à frente de um governo 
capitalista num mundo dominado pelo capital imperialista); 
ou mesmo “democrática” (quando são fanáticos religiosos 
profundamente misóginos e homofóbicos)? O resultado de 
uma hegemonia do Hamas na resistência palestina contra 
Israel seria aprisionar as massas palestinas ao nacionalismo 
islâmico, alienar (ainda mais) os trabalhadores israelenses 
de qualquer oposição ao regime sionista e garantir que, de 
uma forma ou de outra, os interesses sujos da burguesia 
seriam assegurados. Nenhum marxista digno do nome 
pode sustentar tal posição. 

A escandalosa caracterização do proletariado 
israelense 

Se a palavra de ordem do PSTU por uma “Palestina 
livre, laica e democrática” é uma clara limitação a um 
programa democrático burguês, fruto de sua capitulação ao 
nacionalismo árabe procapitalista, há ainda outro aspecto 


22 


da sua política que também é um enorme obstáculo para 
qualquer perspectiva de revolução proletária. Segundo a 
caracterização feita pela LIT em 2011: 

“Assim como o Estado sionista não é um Estado 
normal, mas sim um enclave militar, tampouco o é 
a classe operária que lá vive. Ao ser Israel um Estado 
artificial, baseado no roubo e superexploração dos 
palestinos, a classe operária judia em Israel é também 
parte da ocupação, ou seja, recebe privilégios da 
ocupação. Em outras palavras, tem um nível de vida 
melhor do que o dos trabalhadores árabes exatamente 
porque recebe migalhas derivadas da exploração 
destes, e pelo dinheiro que Israel recebe dos 
EUA. “Nenhuma classe operária no mundo, como já 
dizia Marx, luta para piorar seu nível de vida ou para 
perder seus privilégios. Por isso a classe operária 
israelense não é(e nem será) revolucionária, sequer 
reformista. É intrinsecamente reacionária. Seu 
bem-estar depende da continuidade e da ampliação 
da ocupação do território palestino, de seu caráter 
de Estado policiesco. Não se pode esperar dos 
trabalhadores judeus uma mudança [de] caráter do 
Estado sionista, para que este deixe de ser racista 
e expansionista. Israel não pode ser reformado, só 
pode ser destruído.” 

Sobre o movimento dos “ indignados ” de Israel, 
Partido Operário Internacionalista (POI- Rússia), 
setembro de 2011. Ênfase nossa. Disponível 

em: http://www.pstu.org.br/teoria matéria. 

asp?id= 1 3 3 97&ida=0 

Comecemos pela caracterização de Israel como 
um “enclave militar”. O regime sionista certamente é 
financiado pesadamente pelo imperialismo, mas a base da 
sua existência é também a exploração dos trabalhadores 
israelenses e das massas palestinas, de forma que não 
se trata de uma mera instalação imperialista no Oriente 
Médio. E Israel não é o único Estado que recebe insumos 
financeiros e militares por ser um aliado fiel das potências 
imperialistas. O mesmo se dá com vários países árabes, 
como é o caso da Arábia Saudita, que as grandes potências 
usam como fantoches locais para contrabalancear os 
governos burgueses “instáveis”, como o Irã. 

Além disso, conforme afirmamos em nossa já 
mencionada declaração, “A população israelense não pode 
ser considerada simplesmente como colonos nesse momento 
da história. Quer queira quer não , se desenvolveu na 
região uma nacionalidade de fala hebraica .” ( Defender os 
palestinos! Nenhuma confiança no Hamas e no Fatahl, de 
agosto de 2014). Ao apagar a existência dessa nação (e sua 
divisão em classes fundamentalmente antagônicas) a LIT 
reduz a contradição fundamental da sociedade israelense, 
não à luta entre burgueses e proletários, mas a uma luta de 
ambos os burgueses e proletários israelenses contra o povo 
palestino (também aqui tomado em bloco, como se não 
houvesse contradições de classe). 


Os marxistas não se opõem ao direito dos judeus de 
habitar na Palestina, nem aos direitos daqueles que para lá 
emigraram. A oposição dos marxistas é ao projeto sionista, 
que defende um Estado exclusivamente israelense, com 
um regime teocrático e que oprima as massas palestinas, 
segregando-as sistematicamente através de métodos 
jurídicos e militares. Corretamente, a Quarta Internacional 
foi contra a fundação do Estado de Israel em 1948, ao 
mesmo tempo em que buscava ganhar os trabalhadores 
israelenses contra o sionismo [3].E de um simplismo 
absurdo tentar reduzir toda a sociedade israelense de hoje 
em dia a um “enclave militar”. Isso secundariza a divisão 
dessa sociedade em classes fundamentalmente antagônicas, 
colocando em um mesmo patamar os exploradores e os 
explorados. 

Em segundo lugar, embora tenha melhores condições 
de vida do que a maior parte dos seus irmãos nos países 
vizinhos do Oriente Médio, o proletariado israelense não 
é mais privilegiado do que aquele dos países imperialistas 
(na verdade, possui condições de vida bastante inferiores). 
Tanto sua vida não é perfeita e harmônica, que nos 
últimos anos temos visto massivos protestos em defesa 
de mais recursos públicos para serviços e políticas sociais 
como saúde e educação - algo muito mais próximo de 
uma consciência reformista do que de uma consciência 
“intrinsecamente reacionária’ ’ [4]. A LIT se opõe a esses 
protestos e, ao menos nisso, tem a mesma atitude dos dos 
burocratas sionistas que desejam ver tais lutas minguarem 
e fracassarem. 

O fato de que a classe trabalhadora em alguns países 
é privilegiada em comparação com a de outros não muda 
o fato de que é da classe proletária que depende uma 
revolução vitoriosa (e especialmente a classe trabalhadora 
dos países imperialistas, sem os quais o socialismo não 
pode triunfar a nível mundial). Essa desigualdade é um 
elemento estrutural no qual os capitalistas se fiam para 
dividir a classe trabalhadora em linhas nacionais, mas 
o trabalhador israelense tem muito mais vantagens em 
romper com a “sua” burguesia e buscar um poder em 
conjunto com as massas palestinas do que manter sua atual 
condição de classe dominada, explorada e oprimida. 

Ao contrário dos sionistas, os marxistas argumentam 
que o sionismo NÃO serve aos interesses objetivos da classe 
trabalhadora israelita. O Estado de Israel, como Trotsky 
havia previsto, pode acabar sendo uma “armadilha fatal” 
para os judeus que emigraram para lá. Os trabalhadores 
judeus não se beneficiam de viver sob o capitalismo 
sionista, e o seu atual apoio à “sua” classe dominante, 
assim como o apoio que a classe trabalhadora de muitos 
países presta aos “seus” governos, é uma falsa consciência 
que os revolucionários devem buscar desmascarar. 

Ao fim e ao cabo, é de uma total falta de coerência que 
supostos marxistas acreditem seriamente que trabalhadores 
tem a perder (“piorar seu nível de vida” ou “perder seus 
privilégios”) ao derrotar seus patrões e assumir o controle 
da riqueza por eles produzida. Certamente, do que os 
trabalhadores israelenses jamais poderão ser convencidos 


23 


é apoiar partidos nacionalistas islâmicos como o Hamas 
(e que o PSTU considerou em 2007 que deveria estar à 
frente dos palestinos) que são contra seu direito a existir 
enquanto povo. Mas eles têm todas as razões objetivas 
para lutar lado a lado das massas palestinas pela destruição 
do regime sionista e por uma Palestina socialista dos 
trabalhadores de todas as religiões e etnias (que é 
uma tarefa que o PSTU relega a um futuro incerto). O 
que impede os trabalhadores israelenses de lutar por esse 
objetivo é sua cegueira diante da ideologia sionista e a 
ausência de um partido revolucionário que defenda a união 
intemacionalista dos trabalhadores dos dois povos contra 
seus verdadeiros inimigos. 

Essa escandalosa caracterização realizada pela 
LIT, faz com que ela subestime completamente o 
proletariado israelense como um poderoso aliado em 
potencial das massas palestinas na luta por sua libertação. 
Tal postura de considerar que a classe trabalhadora de 
Israel é “intrinsecamente reacionária” também significa 
o abandono de qualquer perspectiva realista de revolução 
socialista na região, uma vez que os trabalhadores 
israelenses constituem atualmente o maior componente da 
classe trabalhadora. 

Esse abstencionismo diante do proletariado 
israelense é o lado reverso da sua capitulação aos 
partidos nacionalistas árabes. E tal capitulação é tão 
profunda que chega ao extremo de defender e legitimar 
ataques reacionários indiscriminados contra a população 
israelense, 

“As organizações da esquerda mundial devem 
responder claramente às seguintes perguntas: 
estamos a favor de que a atual guerra se desenvolva 
até derrotar completamente o exército sionista 
e o Estado de Israel? Estamos a favor de que as 
ações contra a população do enclave colonial 
israelense - por parte do Hizbollah, do Hamas e 
do Jihad Islâmica - aumentem e sejam cada vez 
mais efetivas? (...) Aqueles que responderem 
negativamente a estas questões deixaram de ser 
revolucionários para, nas palavras de Lênin, 
transformarem-se em ‘meros pacifistas pequeno- 
burgueses’. De nossa parte, reiteramos a resposta 
afirmativa a cada uma destas questões 
Pela destruição do “Estado policial ” de Israel, de 
agosto de 2006 . Ênfase nossa. 

Duas coisas estão amalgamadas nesse parágrafo. 
Primeiro, o PSTU parece se referir à defesa da Palestina e 
de outras nações oprimidas por Israel (como era o caso do 
Líbano, que estava sendo atacado em 2006), que é uma tarefa 
de todos os comunistas consequentes. É evidente que, por 
desejarem a derrota do Estado sionista por uma revolução, 
os trabalhadores se beneficiam do enfraquecimento de 
Israel sob os golpes de uma nação por ele subjugada, ainda 
que não devam dar nenhum milímetro de apoio político aos 
nacionalistas burgueses. Mas a seguir, o PSTU reivindica 


o apoio a atos de agressão contra a população de Israel (o 
que incluiria certamente a sua classe trabalhadora). Não 
há nada de “leninista” em apoiar atos sanguinários de 
ódio étnico. O PSTU menciona Lenin (sem citar nenhum 
texto seu) afirmando que quem não apoia tais atos é um 
“pacifista pequeno-burguês”. Ainda que não concordem 
com métodos “terroristas”, os comunistas não condenam 
atos de violência que tenham como alvo membros da 
burguesia, seu exército e sua estrutura de repressão (como 
aqueles que realizavam os Narodiniki russos). Mas nada há 
de vantajoso para os trabalhadores em reivindicar ataques, 
digamos, a residências, escolas ou estações de trem em 
Israel por grupos islâmicos. Tais ataques são reacionários e 
só reforçam o clima de ódio comunal da região, atingindo 
principalmente trabalhadores. 

O fato de os dirigentes da LIT preferirem ignorar 
os interesses comuns entre os explorados árabes e os 
explorados israelenses demonstra uma total falta de fibra 
revolucionária para defender o programa da classe proletária 
e uma vontade de “escolher a linha de menor resistência”. A 
consciência de classe atrasada dos trabalhadores israelenses, 
grande parte dos quais (contra os seus interesses objetivos) 
defende formas de ideologia burguesa como o sionismo, 
faz tais revisionistas acharem um “refugio” numa popular 
ideologia nacionalista árabe, também burguesa, porém mais 
receptiva. Contra essa capitulação, os marxistas reiteram 
que a sua guerra contra o regime sionista é uma guerra 
de classe, a ser protagonizada pelos trabalhadores 
palestinos e israelenses (junto às outras classes oprimidas 
e com apoio dos proletários do restante do Oriente Médio). 
A posição dos revolucionários de defesa tático-militar 
dos palestinos contra Israel, incluindo alianças tático- 
militares com os partidos burgueses ou pequeno-burgueses 
palestinos que resistem aos ataques sionistas, deve sempre 
vir acompanhada de uma denúncia implacável da falsa 
política do nacionalismo burguês. 

Nahuel Moreno e seu fatalismo antimarxista 

A capitulação da LIT ao programa do nacionalismo 
árabe (já abandonado por seus próprios representantes) 
e aos limites capitalistas desse programa possui em sua 
raiz as posições programáticas desenvolvidas por Nahuel 
Moreno, o falecido dirigente argentino fundador dessa 
organização. Em 1982, numa polêmica publicada 
em Correio Internacional número 8 (setembro de 1982), 
Nahuel Moreno discutiu com um companheiro da seção 
chilena da LIT, que levantou críticas bastante pertinentes 
(ainda que limitadas) à sua política oportunista. O primeiro 
questionamento levantado pelo “companheiro chileno” 
(cujo nome não é revelado) foi o seguinte: 

“1. Por que levantamos como consigna central 

a de ‘Palestina laica, democrática e não racista’ 

burguesa? Por que estamos pela construção de um 

Estado burguês na Palestina? Fica entendido que, se 

surgir um Estado com essas características na luta 


wikipedia.org 


24 



Em 2011 massivos protestos varreram Tel Aviv, em torno de deman- 
das por moradia, saúde e educação de qualidade. Isso mostra o 
potencial de luta que emana das contradições capitalistas a que 
também se encontram submetidas as massas israelenses 


contra o sionismo e o imperialismo, o apoiamos, 
mas não está claro porque hoje a reivindicamos 
como nossa consigna”. “2. Não fazemos com 
isso uma concessão à ideologia reacionária da 
‘revolução por etapas’, tão cara ao estalinismo e à 
pequena-burguesia? Se não nos equivocamos, essa 
foi a consigna central do estalinismo e da burguesia e 
pequena-burguesia palestina até agora pouco (como 
assinala Correio Internacional 7). Não dizemos o 
mesmo que o estalinismo quando afirmamos que esse 
Estado burguês palestino servirá ‘como um passo na 
luta pelo socialismo’ (declaração da LIT)?”. 

“Carta de um camarada chileno” 
(espanhol). Disponível em: http://tinvurl.com/ 
hópdódt . 


De fato, Moreno realizou uma profunda revisão 
do arcabouço programático do marxismo na questão da 
estratégia revolucionária. Diferente do esforço feito pela 
Internacional Comunista e pela Quarta Internacional 
para buscar uma estratégia para a revolução proletária 
mundial mesmo nos países atrasados do capitalismo, onde 
era fundamental ganhar o apoio do campesinato (que era 
maioria dapopulação), Moreno se adaptou à ideia de que era 
necessário se limitar a um programa democrático-burguês 
numa “primeira fase” da revolução em todos os países do 
mundo. Ele colocou abertamente que era necessária uma 
“etapa”, que chamou de “revolução democrática”, na luta 
pela revolução socialista. Isso não é uma leitura parcial, 
mas algo que Moreno afirmou abertamente: 


“Aqui há um problema político grave, tremendo, que 
toco de passagem - se tivermos tempo, faremos um 
grande livro. Parece que o fato da contrarrevolução 
capitalista recolocou a necessidade de que haja uma 
revolução democrática. E ignorar que o que está 
acontecendo nos países adiantados, onde há regimes 
contrarrevolucionários, também é uma revolução 
democrática, é maximalismo, é tão grave quanto 
ignorar a revolução democrático-burguesa nos 


países atrasados. Isto é muito importante. Não sei se 
é correto ou não. Se é correto, é preciso mudar toda 
a formulação das Teses da Revolução Permanente.” 

Escola de Quadros, “Teoria da Revolução” 
(espanhol), 1984. Disponível em: http://tinvurl. 
eom/ikmygn8 . 

Tal postura altera a forma como se lida com os 
partidos burgueses e pequeno-burgueses. De inimigos da 
revolução proletária aos quais não se pode dar nenhum 
apoio político e dos quais se deve expor a capitulação e 
as vacilações para ganhar de suas bases os trabalhadores 
conscientes, eles passam a “líderes” de uma “revolução 
democrática”, aos quais os morenistas dão seu apoio. 
Prossegue Moreno: 

“Se é correto, muda toda nossa estratégia com 
respeito aos partidos oportunistas e, em boa medida, 
com respeito aos partidos burgueses que se opõem 
ao regime contrarrevolucionário. Como um passo 
até a revolução socialista, nós estamos a favor que 
venha um regime burguês totalmente distinto.” 
Ident. 

Este “etapismo” descarado, a disposição em 
orientar a luta do proletariado em tomo de tal “revolução 
democrática”, a qual jamais existiu fora da imaginação fértil 
de Moreno e dos seus seguidores [5], “mudam a estratégia 
com relação aos partidos burgueses”. Na sua carta, o 
“companheiro chileno” astutamente pergunta: “O nosso 
método é seguir pela ‘esquerda ’ a pequena-burguesia e ir 
retomando os restos das consignas que ela abandona no 
caminho de sua capitulação diante do imperialismo? 

Efetivamente, Moreno e a LIT renegaram a posição 
trotskista de que a luta pela revolução proletária deve estar 
em primeiro plano político inclusive na defesa de uma nação 
oprimida. Moreno e Cia. renegam também que o sujeito 
político dessa revolução deve ser o partido de vanguarda 
do proletariado, armado com o programa bolchevique. 
Contrariando os ensinamentos fundamentais da Teoria da 
Revolução Permanente, preferem depositar suas esperanças 
na falsa noção de uma “revolução democrática” como a 
antessala daquela, sendo esta supostamente liderada por 
partidos oportunistas e mesmo burgueses. 

O método de Moreno portanto não é o do marxismo, 
que é encontrar as formas de ganhar o proletariado para o 
programa da revolução socialista, fazendo-o romper com a 
ideologia burguesa e com os partidos burgueses, mas sim 
um método objetivista, para o qual não importa a atual 
liderança das massas ou seu caráter de classe, deve-se tentar 
“empurrá-la” para o caminho da “revolução democrática” 
(mesmo quando esses partidos burgueses rejeitam as 
demandas democráticas mais básicas, como é o caso do 
Hamas). Esse é também o motivo do seu abandono da luta 
para ganhar o proletariado israelense para o programa do 
marxismo, já que este é muito mais politicamente atrasado. 
Na sua resposta ao “companheiro chileno”, Moreno dá 




25 


uma verdadeira “aula” do seu método objetivista: 

“Se o propósito decisivo e fundamental é a destruição 
do Estado sionista, se trata de estabelecer quais 
são as forças objetivas que neste momento estão 
embarcadas nessa tarefa progressiva, histórica, e 
quais são as melhores consignas para apoiá-las 
e conseguir com que cumpram seu compromisso 
com o maior entusiasmo e forçai “Acaso estão 
fazendo isso os explorados e discriminados sabras 
e sefarditas de Israel? Ou são os trabalhadores 
asquenazes? Nesse momento essas forças são o 
baluarte do Estado sionista e não a vanguarda da 
sua destruição. A aristocracia operária asquenaze, 
através do Partido Trabalhista, está em tudo com 
o sionismo. Os sabras e sefarditas deram a base 
eleitoral a Begin e apoiaram com entusiasmo seu 
plano de colonização das terras árabes.” “Isso 
deixa atualmente como único setor social em luta 
permanente contra Israel o movimento árabe e 
maometano, em cuja vanguarda indiscutível estão 
os palestinos, expulsos de sua pátria pelos sionistas. 
Há 34 anos, quando se construiu o Estado racista, a 
forma de lutar pela sua destruição é apoiar a justa 
guerra dos palestinos e muçulmanos. Não vemos 
outra, porque não há outra força na realidade 
objetiva que se enfrente, de armas na mão, contra 
o sionismo.” (ênfase nossa). 

Polêmica sobre o Oriente Médio 
(espanhol). Disponível em: http://tinvurl.com/ 
hópdódt . 

O marxismo considera que a única classe 
consistentemente revolucionária da sociedade moderna 
é o proletariado. Os revolucionários não se desesperam 
diante da atual consciência atrasada dos trabalhadores. 
No Programa de Transição, Trotsky falou sobre a distância 
entre as tarefas históricas colocadas para o proletariado e o 
seu nível atrasado de consciência para cumpri-las. E preciso 
pacientemente construir aos poucos uma consciência 
revolucionária no seio das lutas do proletariado. Mas o que 
Moreno fez foi aceitar como “fato consumado” o atraso 
dos trabalhadores israelenses e que a liderança da luta 
contra o regime sionista seria a burguesia árabe, na figura 
da OLP, ignorando completamente as traições realizadas 
por essa direção, prometendo “apoiá-la”, adaptando para 
isso as suas consignas e o seu programa. Esse método é 
mantido até hoje pelos seus seguidores. Apoiar qualquer 
força “objetiva” (ou seja, com influência de massas) 
em luta contra governos inimigos do proletariado, 
independente do programa, liderança e classe social 
que esta força represente. É evidente que a OLP jamais 
cumpriu a esperança dos morenistas. Ao contrário, seguiu 
a sua trajetória esperada e cada vez se adaptou mais aos 
interesses sionistas e imperialistas. 

Outro questionamento do “companheiro chileno” 
foi: “ Por que sequer caracterizamos a OLP no Boletim 


Interno? Acaso não é uma organização frentista 
controlada pela burguesia e pequena-burguesia, com 
Arafat como expressão disso? Não é uma organização que 
já deu várias amostras de sua capitulação - em aberta 
contradição com o incrível heroísmo demonstrado pelo 
povo palestino?” . Em seu entusiasmo por embelezar a OLP 
como liderança de sua “revolução democrática”, Moreno 
rasgou completamente o marxismo: 

“Vocês caracterizam a OLP como se fosse um partido 
político a mais. Para nós, representa a nacionalidade 
palestina como organização estatal sui generis laica, 
democrática e não racista, em guerra. É quase 
um Estado: é uma frente única que abarca todo o 
movimento palestino em luta para reconquistar 
sua pátria e voltar a ser um Estado. De fato, é um 
governo, exigimos o seu reconhecimento do mesmo 
modo como fazíamos pela FSLN na Nicarágua. E 
uma nacionalidade organizada à qual suprimiram a 
terra: quando a recuperar, voltará a ser nação. E uma 
nação sui generis.” “Quando vocês não reconhecem 
essa função da OLP, considerando-a uma simples 
fração política dos palestinos, dão um fundamento 
‘de esquerda’ à caracterização do imperialismo. 
Ele também não a reconhece como organização 
nacional palestina, defmindo-a como uma corrente 
terrorista.” 

Idem. 

Influenciado pela popularidade que então tinha a 
reivindicação da OLP de ser algo como um “governo no 
exílio” e legítimo representante das massas palestinas, 
Moreno introduziu uma categoria alheia ao marxismo, 
de que um partido político pode representar “uma nação” 
como um todo, cada uma de suas classes, do proletário e do 
camponês ao grande capitalista. Rejeitamos o amálgama 
morenista de que aqueles que expuseram o caráter 
burguês da liderança da OLP estavam “fundamentando 
a caracterização do imperialismo”. Trotsky combateu 
precisamente esse tipo de revisionismo básico contra 
Stalin e sua caracterização de que o partido nacionalista 
Kuomintang era um “partido de quatro classes” ou de que 
os governos burgueses de Frente Popular eram “governos 
democráticos antifascistas”. Em todas essas ocasiões, 
eram os estalinistas que defendiam a colaboração com 
a burguesia disfarçando-a de “representante de todas as 
classes democráticas”. Os marxistas não precisam inventar 
esse tipo de artimanha porque seu compromisso é com a 
revolução do proletariado. Ainda que taticamente possam 
defender alianças militares com os partidos burgueses 
de uma nação oprimida, como é o caso dos palestinos, 
reconhecem nestes o seu caráter de classe. A caracterização 
de Moreno servia apenas para tentar blindar a OLP de 
criticas, e assim pavimentar o caminho de sua traição das 
massas palestinas. 

Temos aqui duas estratégias distintas: a do 
morenismo e a do marxismo revolucionário. O primeiro 


26 


consiste em adaptar as palavras de ordem e as consignas 
ao objetivo de tentar “empurrar” os partidos nacionalistas 
burgueses para cumprir uma “revolução democrática” 
cujas demandas estes próprios rejeitam, e que teria como 
resultado esperado um Estado burguês. Também considera 
o proletariado israelense da região parte do mesmo bloco 
que seus opressores e se posiciona contra as lutas deste. 
Esse esquema se mostra completamente falso cada vez 
que um dos “líderes” da suposta “revolução democrática” 
trai as massas palestinas. Já o método do marxismo prevê 
corretamente que essas organizações burguesas vão 
inevitavelmente trair as massas palestinas, e deseja reunir 
estas sob a liderança do proletariado, ao mesmo tempo em 
que quer dividir o “monólito” sionista em linhas de classe. 
Busca assim unificar a luta dos trabalhadores israelenses 
e árabes em tomo dos seus interesses comuns de classe 
e dos direitos democráticos dos palestinos na luta pela 
revolução socialista, que construa um governo proletário 
que possa acender a faísca da revolução internacional. 
Nesse momento, essa é a única via realmente realista para 
os que querem lutar pelo socialismo na Palestina. 

Por uma aliança internacionalista entre trabalhadores 
árabes e israelenses! 

O problema fundamental do proletariado na 
Palestina é a ausência de um instrumento com influência 
de massas que combata o Estado de Israel com os métodos 
e a bandeira internacionalista da classe trabalhadora, 
o partido revolucionário conjunto dos trabalhadores 
israelenses e palestinos que lute para pôr um fim definitivo 
ao terror sionista. Este objetivo só pode ser obtido através 
da mobilização dos trabalhadores das duas nações em prol 
da defesa dos palestinos e por demandas democráticas e 
transitórias que desmascarem o monstro sionista, assim 
como os débeis governantes da “Autoridade Palestina”. 

Diante da inexistência de tal partido, os 
revolucionários não devem se adaptar à consciência atual 
dos trabalhadores, nem às variantes mais “radicais” dos 
interesses burgueses, como o Hamas. O seu papel é lutar 
contra as tendências nacionalistas, socialdemocratas ou 
stalinistas presentes no seio da classe trabalhadora, reunir 
e treinar uma coluna de quadros para construírem, quando 
a oportunidade surgir, o seu partido revolucionário. 


Tal partido deve defender os direitos nacionais 
dos palestinos, incluindo o direito de retomo daqueles 
palestinos que emigraram à força, bem como a 
expropriação e socialização de toda a riqueza produzida 
pelos trabalhadores palestinos e israelenses e a utilização 
democrática, racional e planejada desses recursos para 
melhorar radicalmente as condições de existência desses 
dois povos, a viverem de forma fraterna em uma terra 
compartilhada por irmãos de classe, sem ódio religioso ou 
étnico. Apenas um partido assim será reconhecido pelos 
trabalhadores das duas nações como verdadeiramente seu 
- e carregará a bandeira da sua próxima vitória. 

NOTAS 

[1] Leia nossa declaração: Defender os palestinos! Nenhuma confiança 
no Hamas e no Fatah!, de agosto de 2014. Disponível em http://tinvi.irl. 
com/zp8cypk . 

[2] Veja, por exemplo, todas as declarações recentes publicadas pelo 
PSTU sobre a questão palestina. Nenhuma toca (sequer menciona) na 
questão das tarefas de uma revolução socialista, se limitando sempre ao 
programa da “Palestina laica, democrática e não racista”: 

Gaza: uma vitória palestina: http://www.pstu.org.br/node/20963 
Os sinais da Terceira Intifada: http://www.pstu.org.br/node/20864 
Juventude Palestina, exemplo de força e resistência', http://www.pstu. 
org.br/node/20864 

Repudiamos a nova agressão de Israel aos Palestinos: http://www. 
pstu.org.br/node/20864 

[3] A posição trotskista na Palestina: Contra a Corrente (1948): http:// 
tinvurl.com/zfofqfs . 

[4] Tendo em vista o reacionário antissemitismo tão disseminado entre 
os russos por gerações de brutais opressores (dos Czares a Stalin), é 
preocupantemente suspeito que o artigo afinnando que os trabalhadores 
israelenses não podem ser “sequer reformistas” tenha sido escrito 
justamente pela seção russa da LIT, o POI. Cabe ressaltar que, apesar 
de essa posição ter sua origem em formulações do próprio Moreno, 
como demonstraremos na seção seguinte, ela não tem aparecido de 
forma explícita em artigos e declarações próprias do PSTU ou da 
direção da LIT. Cabe ressaltar ainda que esse tipo de afirmação justifica 
diretamente a defesa que a LIT faz de agressões contra a população 
israelense, como criticamos adiante. 

[5] Somente nos últimos anos, tivemos dentre as “revoluções 
democráticas vitoriosas” propagandeadas pelos morenistas a intervenção 
imperialista sobre a Líbia que colocou os “rebeldes” no poder e o golpe 
militar contra o governo da Irmandade Muçulmana no Egito. Confira 
nossas polêmicas: 

De que lado da trincheira?. Disponível em http://tinvurl.com/od7f3e5 . 
O golpe militar no Egito e a posição escandalosa do PSTU/LIT. 
Disponível em: http://tinvurl.com/o6viDiih . 


Continuação da p. 34 t t , . . 

(CNS) tenta administrar as 

diferentes unidades do Exército Livre da Síria (ELS), que 
é um racha das forças armadas do país. Desde 20 1 1 , o ELS 
ganhou importantes posições no país, mas muitas foram 
perdidas de volta para Assad ou tomadas pelo Estado 
Islâmico. Em nosso artigo de 2012, nós explicamos a 
composição política e militar do CNS/ELS: as ligações 
dos seus componentes principais com os imperialistas e 
o seu programa burguês. Desde então, o ELS foi pouco 
a pouco dominado por forças de orientação religiosa 
(principalmente os líderes sunitas insatisfeitos com os 


aspectos seculares do regime alauita de Assad). O ELS 
também passou a operar junto com outras forças, tais quais 
a “Frente Islâmica” que se originou em 2014. 

Apesar das ilusões na esquerda de que suas operações 
contra o regime Assad constituíam parte da “revolução 
síria”, deixamos claro naquele artigo que esses “rebeldes” 
não são uma força política que vá trazer conquistas para 
os trabalhadores sírios, menos ainda para as minorias 
nacionais do país. 

Os Estados Unidos não conseguiram uma aliança 
duradoura com a maioria dos rebeldes, que não foram 


27 


considerados “moderados” o suficiente. Washington tem 
tomado mais cuidado com seus aliados desde a desastrosa 
experiência na Líbia, onde muitas das armas enviadas 
acabaram caindo nas mãos de extremistas antiamericanos. 
Algumas unidades específicas do ELS, entretanto, 
receberam significativa ajuda militar dos Estados Unidos e, 
nesse momento, Obama já começou a treinar o seu próprio 
“grupo rebelde”, o qual deve ser denunciado enquanto uma 
tropa terrestre do imperialismo. Conforme noticiado: 

“Os EUA decidiram fornecer caminhões com 
metralhadora e rádios para chamar bombardeios 
aéreos a alguns rebeldes sírios moderados, disseram 
oficiais da Defesa. Mas não foi combinado o 
alcance de nenhum bombardeio - um reflexo das 
complexidades do campo de batalha na Síria. 

“O plano chega enquanto os EUA preparam- 
se para começar a treinar rebeldes moderados, que 
estão travando uma luta em duas frentes contra os 
extremistas e o regime sírio. Oficiais da Defesa 
disseram que o treinamento vai começar em 
meados de março, na Jordânia, com um segundo 
acampamento previsto para abrir logo depois na 
Turquia.” 

Os EUA darão a alguns rebeldes sírios 
a capacidade de chamar bombardeios, 17 de 
fevereiro de 2015. Disponível em: http://tinvurl. 
com/koixzx5 

[Janeiro de 2016: a entrada da Rússia no conflito 
a partir de outubro 2015, incluindo tanto ataques aéreos 
como envio de grandes quantidades de tropas terrestres 

- inicialmente favorecendo Assad e posteriormente dando 
apoio logístico e militar também a certas forças rebeldes 

- complexificou o cenário. Atualmente, tudo aponta para 
a construção de um governo de transição que contemple 
os interesses econômicos tanto da Rússia quanto dos EUA, 
bastante distintos, é bom que se diga, dos interesses dos 
trabalhadores e do povo sírio.] 

Outro competidor reacionário na guerra civil síria 
que tem ganhado força recentemente é o autodenominado 
Estado Islâmico da Síria e do Levante (EI). Ele era antes 
parte de uma mesma operação militar fundamentalista 
com o Al-Qaeda na Síria (Frente Al-Nusra). Foi a Frente 
Al-Nusra quem rompeu relações com EI no início de 2014, 
afirmando que eles eram “intransigentes demais”. 

A essa altura, o EI já ti nh a tomado importantes 
posições no Iraque. Financiado largamente por barões do 
petróleo muçulmanos dos países que também estavam 
dando apoio aos rebeldes, os chamados “Amigos da Síria” 
(Turquia, Catar e Arábia Saudita), o EI se beneficiou de 
suas ligações com a oposição síria para obter armas e 
recrutar combatentes. Chegou ao poder em importantes 
cidades iraquianas como ponta de lança de uma revolta 
sunita contra o governo xiita apoiado pelos Estados Unidos. 
A partir de então, o EI controlava um território maior do 


que o Al-Qaeda jamais foi capaz. Muitas das cidades sob 
seu poder tem uma grande produção petrolífera, que o EI 
exporta para financiar seu esforço expansionista. Ele está 
em guerra contra o governo iraquiano (que recebe ajuda de 
tropas americanas no terreno) com a intenção de construir 
um “Califado” sob seu rígido controle. Por volta da mesma 
época, o EI reforçou suas posições na Síria e tomou 
províncias no desértico leste do país, e toda a região de 
fronteira entre o Iraque e a Síria. Ele tem lutado ao mesmo 
tempo contra Assad e forças oposicionistas, especialmente 
unidades do ELS. 

O EI parece ser a mais bem treinada e equipada 
das forças de oposição ao governo. Cerca de 8 milhões de 
pessoas vivem nas cidades que ele controla nos dois países 
e o grupo conseguiu estabelecer um tipo de “economia 
de guerra” na qual a população fica dependente deles 
para obter comida e outras necessidades, o que até agora 
garantiu uma colaboração passiva com a sua ocupação. Eles 
tem perseguido severamente minorias não-muçulmanas (e 
mesmo alguns grupos muçulmanos) e se gabam a respeito 
de escravizar e vender mulheres de outras religiões, assim 
como de massacrar grupos de aldeões não-muçulmanos. 
O EI controla cerca de um terço do território sírio, onde 
impuseram a Lei Islâmica / Sharia. 

Consideramos o Estado Islâmico uma forma de 
reação fundamentalista que busca eliminar mesmo os 
direitos políticos, sociais e seculares mais básicos do 
povo. Se o EI for vitorioso em todo o território sírio, 
isso significaria a queda de muitas minorias étnicas e 
religiosas em uma condição de escravidão, ou sua simples 
execução. Um partido revolucionário de trabalhadores 
na Síria buscaria defender o povo oprimido e organizar 
as massas trabalhadoras das cidades e do campo contra 
esses bandidos cruéis. A sua derrota é essencial para os 
trabalhadores. Porém, nosso chamado para derrotar o EI 
não muda nossa denúncia e oposição à intervenção aérea 
conduzida pelos Estados Unidos. 

Os imperialistas não apresentam uma alternativa 
de melhoria de vida para o povo sírio e já foram capazes 
de ações dezenas de vezes mais bárbaros que as do EL O 
crescimento do EI é, em última instância, um subproduto 
da sua desastrosa ocupação do Iraque, apenas para dar um 
exemplo. Enquanto o governo e a grande mídia americana 
expõem as crueldades do Estado Islâmico, escondem os 
atos de terror cometidos pelos seus aliados na Síria, que 
também incluem muitas atrocidades (sem mencionar o alto 
número de vítimas e ferimentos provocados pela morte que 
cai do céu na forma de bombardeios). 

Nós não temos nenhuma pena pelas derrotas que 
os imperialistas sofrerem no Iraque e na Síria. Não nos 
esquecemos dos crimes cometidos pelos imperialistas 
no Iraque (incluindo as mortes de cerca de 120.000 civis 
iraquianos) e consideramos sua expulsão do Oriente 
Médio, assim como a derrota de suas “tropas terrestres”, 
como uma prioridade. Mas apesar do fato de que o EI tem 
sido o alvo dos bombardeios imperialistas, a sua conquista 


28 


de cidades iraquianas e sírias com objetivo de estabelecer 
regimes de terror não é nenhuma forma de “luta anti- 
imperialista” e sim uma ação reacionária. 

As “boas intenções” de Obama em bombardear o EI 
para supostamente salvar minorias na Síria são mentirosas. 
A intervenção americana tem o propósito único de 
garantir seu poder sobre o país. Qualquer um que duvide 
das intenções dos EUA (e de outras grandes potências) 
na Síria deveria olhar para os “grandes experimentos 
de democracia” que se tomaram a Líbia e o Iraque. Os 
bombardeios americanos tem a intenção de ganhar tempo 
e conter o El (ao mesmo tempo em que o usa para cansar 
o regime Assad) enquanto Washington organiza melhor as 
forças leais a si no território sírio. 

[Janeiro de 201 6: Atualmente, esse parágrafo parece 
ter se desatualizado diante da aparente decisão dos EUA, 
França e Grã-Bretanha de destruir o EI, pressionados 
pelos bombardeios russos em defesa de Assad e pelo 
alarme mundial com relação aos fundamentalistas. Porém, 
na altura em que esse texto foi escrito, tudo indicava que 
a estratégia dos EUA girava em torno de “ administrar ” 
a situação, deixando o EI enfraquecer Assad e buscando 
fortalecer as posições dos rebeldes mais “moderados ”.] 
Além de levar em conta as ameaças dos imperialistas 
de um lado e do Estado Islâmico de outro, não se pode 
perder de vista que uma revolução proletária na Síria 
só pode vencer por cima do cadáver morto da brutal 
ditadura de Assad. O ditador e seu partido impuseram a 
ordem capitalista sobre a classe trabalhadora por décadas, 
com os mais brutais métodos. Seria prioritário organizar 
autodefesas entre os trabalhadores, especialmente das 
minorias perseguidas contra os vários exércitos em disputa, 
garantindo assim um polo politicamente independente das 
forças reacionárias que lutam pelo poder. 

A esquerda sem independência de classe 

Os grupos na esquerda que afirmam defender a 
vitória de uma inexistente “revolução síria” contra Assad 
usam a ausência de um processo como esse como fachada 
para apoiar os esforços do Exército Livre da Síria. O 
argumento principal é de que muitas das unidades que 
nele participam não são subordinadas à Coalizão Nacional 
Síria. Seriam, em vez disso, forças populares emergindo 
das ruas e dos protestos da Primavera Árabe. 

Essa é a posição, por exemplo, do Secretariado 
Unificado da Quarta Internacional (SU), cuja seção no 
Brasil é a corrente Insurgência, do PSOL. Em seu site 
internacional, foi publicada uma entrevista com um 
membro de um desses grupos aderentes do ELS e que se 
reivindicaria marxista. Quando foi perguntado sobre a 
cooperação com outras unidades do ELS, o combatente 
respondeu: 

“Existe cooperação e coordenação, mas de forma 
limitada. Por um lado por conta das diferentes 
visões e objetivos, ou disparidades entre posições 


devido à localização geográfica onde os camaradas 
estão lutando e a natureza das outras organizações. 
Por outro, essas organizações em geral não aceitam 
ninguém mais....” 

“ Nossa falta de armas nos põe em uma situação 
de fraqueza”, 18 de janeiro de 2015. Disponível 
em: http://tinvurl.com/nhiea3b 

Não surpreende a dificuldade de coordenação com as 
outras unidades do ELS, já que muitas delas são lideradas 
por oficiais leais e subordinados ao CNS, e através deste aos 
seus patrões imperialistas. Isso para não mencionar aquelas 
unidades que mencionamos, que recebem treinamento e 
armas diretamente dos imperialistas. Isso sem esquecer os 
vários grupos islâmicos que também estão sob o teto do 
ELS. 

O ELS é certamente um exército heterogêneo. Mas 
a pergunta que o site do SU não fez a esses combatentes, 
e que deveria ser o primeiro questionamento é: por 
que essa organização (que o SU considera “marxista 
revolucionária”) está trabalhando lado a lado com esses 
tipos? Por que eles, em vez disso, e já que afirmam 
representar a classe trabalhadora síria, não organizam uma 
brigada independente, oposta aos elementos que estão 
mancomunados com os imperialistas para vender o país 
caso consigam derrotar Assad? 

De certa forma, o dilema desses combatentes é o 
mesmo dilema do SU e das demais correntes que apoiam os 
rebeldes contra Assad. Não querem defender uma posição 
proletária independente do CNS e do ELS e só veem 
possibilidade imediata de derrubar o regime junto com 
essas forças reacionárias. Por isso, abandonam qualquer 
pretensão de uma política marxista e passam a embelezar 
a natureza e o programa do ELS, ainda que criticando sua 
liderança. 

Conclusão muito semelhante é compartilhada 
por outros grupos que dizem reivindicar o trotskismo, 
como aquela da morenista Unidade Internacional dos 
Trabalhadores, cuja seção brasileira é a corrente CST, do 
PSOL, com a qual polemizamos de forma mais extensa 
em artigo de outubro de 2012 (O Morenismo e a Posição 
da CST/UIT na Síria), ou como pela também morenista 
Liga Internacional dos Trabalhadores (LIT - dirigida pelo 
PSTU brasileiro). 

Apesar da aderência inevitável de elementos 
iludidos por uma ideologia pretensamente “democrática”, 
reafirmamos que o ELS é, como um todo, controlado por 
oficiais do CNS e outras forças burguesas. Não há nada 
para ser ganho para a classe trabalhadora ao ajudar esse 
exército. A não ser que o SU e outros grupos, como a UIT 
ou a LIT, acreditem em algum tipo de “dinâmica” mágica 
que vá colocar a classe trabalhadora no poder ou numa 
posição melhor no instante em que Assad cair pelas mãos 
dos rebeldes ou do imperialismo. Já vimos esse filme na 
Líbia, na Ucrânia e em muitas outras ocasiões em que 
tais grupos apoiaram o “movimento de massas” com uma 
liderança reacionária. 


storify.com 


29 


A questão curda e a batalha por Kobane 

No cenário já complexo que é a guerra civil na Síria, 
as coisas ficam ainda mais densas ao levar em conta o 
elemento curdo. O Curdistão é a maior nação sem Estado 
no mundo. Estamos falando de cerca de 30 milhões de 
pessoas divididas pelo território da Turquia, Irã, Iraque, 
Armênia e uma pequena região no norte da Síria (Rojava). 
Tal ordem de coisas é um legado da prática de “dividir 
para dominar” do imperialismo britânico após a queda do 
Império Otomano. 

Os marxistas defendem os direitos nacionais dos 
curdos, incluindo o direito à autodeterminação, ao uso do 
idioma em todas as esferas da vida e contra todas as formas 
de segregação. Mas isso não significa que consideramos 
a separação territorial das regiões curdas como uma 
“solução” para os problemas dos trabalhadores dessa 
nacionalidade. Tomaríamos o lado curdo em uma guerra 
pela independência ou por autonomia regional (incluindo o 
apoio militar) se esse for o desejo desse povo em qualquer 
momento. 

Ao mesmo tempo, a separação nacional é, para 
os marxistas, um interesse subordinado à luta proletária. 
Há questões políticas de maior prioridade, como a 
independência de classe dos trabalhadores e a defesa das 
nações oprimidas contra os ataques imperialistas. Eis um 
exemplo ilustrativo. Em 2003, quando os EUA atacaram 
o Iraque, os líderes nacionalistas burgueses do Curdistão 
iraquiano apoiaram a invasão imperialista contra o regime 
de Saddam Hussein, em busca de promessas de maior 
autonomia regional. 

Defendemos todo e qualquer ganho de autonomia 
para a população curda. Mas quando o Peshmerga (o 
exército dos curdos iraquianos) estava lutando sob 
comando do exército americano, não era uma força pela 
independência curda contra Bagdá, mas um braço do 
projeto imperialista de subjugar toda a região. Assim, 
nos oporíamos aos esforços dos capitalistas curdos para 
apoiar a invasão imperialista, ao mesmo tempo em que 
seguiríamos defendendo os direitos nacionais curdos. 

Hoje, uma situação parecida ressurge no Iraque, com 
a coalizão liderada pelos EUA contra o Estado Islâmico. Os 



O cerco à Kobane: tropas do ISIS por todos os lados e tropas turcas 
na retaguarda 


principais partidos políticos curdos no território iraquiano, 
KPD (Partido Democrático Curdo) e PUK (União Patriótica 
do Curdistão), apesar de sua suposta rivalidade, usam sua 
posição à frente do governo regional no norte do Iraque 
para apoiar os imperialistas. 

Mas enquanto no Curdistão iraquiano a cena 
é dominada pelos capachos imperialistas, na Síria a 
força política mais influente entre a população curda é 
atualmente o Partido da União Democrática (PYD), que é o 
associado sírio do antes maoista Partido dos Trabalhadores 
do Curdistão (PKK), que opera na Turquia. Em 2012, as 
tropas leais a Assad se retiraram completamente das regiões 
curdas, o território conhecido como Rojava. Não está claro 
se devido a limitações militares ou como uma tentativa 
demagógica de ganhar apoio dos curdos, ou ambos. E 
desde então Rojava basicamente ficou sob controle do 
PYD. Através de sua organização militar, as Unidades de 
Proteção Popular (YPG), o PYD entrou em confrontos 
com ambos o regime Assad e a oposição, em diferentes 
ocasiões. Mas desde que o avanço do Estado Islâmico no 
norte começou, o YPG tem entrado consistentemente em 
choque com ele. 

As investidas do EI no território sírio colocaram-no 
em conflito com os curdos em julho de 2014 em Kobane 
(um dos três cantões sob o governo do PYD próximos da 
fronteira com a Turquia). Isso chamou atenção mundial 
e a resistência curda ganhou vasta simpatia, ficando 
conhecidos como os “revolucionários que enfrentam 
o Estado Islâmico”. O EI finalmente foi derrotado na 
região no começo de 2015 através de uma combinação 
da luta incansável dos curdos (que estiveram sempre em 
inferioridade técnica) e bombardeios imperialistas. Kobane 
ficou sitiada por meses, durante os quais muitos grupos na 
esquerda (especialmente alguns anarquistas) falavam de 
um caráter revolucionário da resistência curda. 

O PYD é um partido fundado em 2003 por ativistas 
simpatizantes do PKK na Síria. Ele era considerado pelo 
governo sírio como um fator de instabilidade devido a seu 
apoio popular e por operações clandestinas nas regiões 
curdas. Sua principal fonte de orientação ideológica é o 
PKK, que foi criado em 1978 como um grupo maoista 
dedicado à resistência armada contra a opressão da 
população curda na Turquia e que tem uma longa história 
de resistência contra o governo. 

Mas, aparentemente, o PKK não é mais um aderente 
do maoismo, com suas práticas stalinistas de perseguição 
a oposicionistas internos e um programa de “guerra 
popular” cambaleando entre um programa democrático 
burguês de “Nova Democracia” e a perspectiva de 
reproduzir um regime burocrático de economia estatizada, 
como a China de Mao. De acordo com muitos relatos, 
desde a prisão de Abdullah Ocalan (seu líder histórico) 
em 1999, o PKK tem passado por uma transformação 
programática rumo ao que é descrito pelo próprio Ocalan 
como “Confederalismo Democrático”. Esse é um ponto 
de vista inspirado por autores libertários e que busca a 
construção de “autogovernos populares” sem Estado, em 


30 


cada localidade. 

O PKK ainda é considerado pela OTAN e pelo 
governo turco como uma “organização terrorista” e os 
marxistas por todo o mundo tem o dever imperativo de 
defender o grupo contra todos os ataques vindo do brutal 
regime de Erdogan. Com exceção de alguns breves 
períodos de trégua (o último dos quais vem desde 2013), o 
PKK tem continuamente lutado contra o regime turco por 
autonomia para as regiões curdas. Mas embora seja difícil 
dizer quão consolidado é esse giro (é preciso lembrar que 
o PKK segue uma organização clandestina), ele parece ter 
mudado definitivamente a feição do grupo. 

Para os trotskistas, os trabalhadores e camponeses 
precisam construir um poder baseado em suas próprias 
forças para esmagar a dominação militar, política e 
econômica da burguesia e impedir suas tentativas de 
retomar ao poder após uma insurreição vitoriosa. Esse 
autêntico “governo de trabalhadores” deve abranger 
todo o território e se basear em representantes eleitos 
democraticamente pelos proletários e camponeses (e 
revogáveis pelas assembleias que os elegeram). Essa é 
a fórmula capaz de equilibrar a natureza local da gestão 
democrática direta com os interesses de grande escala da 
classe trabalhadora em todas as áreas. 

Por último, mas não menos importante, esse governo 
deve dar apoio intemacionalista e suporte material e político 
aos proletários dos outros países nas lutas para derrotar as 
“suas” burguesias. O socialismo não pode ser alcançado 
em bases nacionais e, em última instância, nenhum 
governo de trabalhadores pode sobreviver isolado em um 
mundo dominado pelo imperialismo. O programa político 
do PKK/PYD parece passar por cima da necessidade 
de construir essa “ditadura proletária” baseada em uma 
economia coletivizada e no poderio militar centralizado 
dos trabalhadores. 

Como foi mencionado, o PYD tem o controle 
militar da região de Rojava. Ele adotou uma “Carta 
do Contrato Social de Rojava” no início de 2014 e esse 
documento constitucional não faz nenhuma menção ao 
socialismo, controle coletivo dos meios de produção ou 
democracia operária. Trata-se de uma combinação confusa 
de participação comunitária e manutenção da propriedade 
privada. O artigo 41 assegura que “Todos tem o direito 
de possuir propriedades e a posse pessoal é garantida”, 
enquanto o artigo 42 diz que o sistema econômico busca 
“garantir a economia participativa enquanto promove 
a competição de acordo com o princípio da gestão 
democrática ‘A cada um de acordo com seu trabalho’.” 

[Janeiro de 2016: Com a derrota do EI, o PYD 
se estabeleceu em uma região onde todos os partidos e 
governos burgueses haviam sido derrotados ou se retirado. 
Ele não é um partido burguês, mas uma organização 
baseada na mobilização de trabalhadores e camponeses 
da região. As condições são as mais propícias para o 
estabelecimento de um governo proletário, com controle 
democrático dos trabalhadores e camponeses sobre os 
meios de produção, a política e o exército. No entanto, 


vemos que o PYD não tem clareza sobre a natureza do 
regime que ele quer construir. Embora tenha um discurso 
democrático, a manutenção da propriedade capitalista 
coloca limites claros de desigualdade e de democracia 
na sociedade. Diante do que aconteceu até o momento, 
não existe nenhuma garantia de que o governo do PYD 
romperá com a burguesia de forma definitiva. Os lutadores 
da região devem lutar por uma direção revolucionária e 
combater as vacilações da atual] 

Durante e após a batalha contra o Estado Islâmico 
em Kobane, o PYD também propagou perigosas ilusões 
nas unidades Peshmerga do governo regional curdo 
no Iraque (das quais recebeu armas) e na intervenção 
aérea dos EUA. Eles soltaram uma declaração pública 
“agradecendo” a ambos por sua luta contra o EI, durante 
a qual o PYD deu aos EUA aconselhamento militar tático 
(onde realizar os bombardeios). Um líder do PYD, Saleh 
Muslim, expressou essa postura em várias declarações à 
imprensa: 

“De acordo com Muslim, a coalizão internacional 
‘salvou as vidas de muitos civis’ na sua guerra 
contra o EL... Ele também agradeceu à coalizão 
internacional liderada pelos EUA por apoiar os 
curdos em sua dificuldade e por ajudar as forças 
do YPG a resistirem ao grupo radical EI. ‘Tais 
operações reforçam a relação entre os curdos e 
os Estados que defendem a democracia e a paz’, 
concluiu Muslim.” 

“ Curdos sírios instam coalizão liderada pelos EUA 
a intensificar os ataques contra o EI em Kobane”, 
13 de outubro de 2014. Disponível em: http:// 
tinvurl.com/pkzaufb 

Apesar disso, acreditamos que os marxistas deveriam 
defender Kobane contra o avanço dos reacionários 
fundamentalistas do EI. O que os trabalhadores e militantes 
com intenções revolucionárias em Rojava precisam 
urgentemente é de uma orientação política que seus líderes 
não tem a oferecer: a construção de um poder direto dos 
trabalhadores. Mais importante, é preciso garantir que 
não se desenvolvam expectativas ou ilusões no caráter 
dos governos burgueses do Curdistão iraquiano ou nos 
bombardeios americanos. 

Os EUA tinham a intenção de conter o avanço 
do EI em Kobane (na fronteira com a Turquia) para os 
seus próprios propósitos reacionários, e não “ajudar” o 
povo curdo. Tampouco o governo americano está entre 
os defensores da “democracia e paz” no mundo. Não 
esqueçamos que Washington é um grande aliado do 
regime turco de Erdogan, que durante todo o tempo fez 
de tudo para impedir que o PYD recebesse ajuda das 
bases do PKK na Turquia. Não condenamos o PYD por 
ter conseguido armas de qualquer fonte que as estivesse 
oferecendo (desde que sem imposição de condições). E ele 
certamente tinha o direito de se beneficiar taticamente do 
fato de que o EI estava sendo alvo dos imperialistas, desde 


31 


que tivesse clareza sobre a natureza dos bombardeios. 

O sectarismo de parte da esquerda contra os lutadores 
de Kobane 

Alguns grupos na esquerda se basearam nas posições 
oportunistas da liderança do PYD para justificar tomar o 
lado do Estado Islâmico (!!!) em Kobane. Esse é o caso da 
seita degenerada (mal) disfarçada de organização trotskista 
que é a Liga Espartaquista dos EUA. Em uma edição do 
seu jornal, eles expuseram suas razões: 

“Forças do governo iraquiano e peshmerga curdos 
no Iraque estão novamente conduzindo operações 
militares conjuntas com os EUA, como fizeram 
por anos sob a ocupação. Mais recentemente, 
nacionalistas curdos sírios também selaram uma 
aliança traiçoeira com os EUA na batalha por 
Kobane no norte da Síria, agindo como auxiliares 
de bombardeios dos imperialistas e coordenando 
movimentos militares como um todo. O fato de 
que todas essas forças são ‘tropas terrestres’ para a 
intervenção imperialista significa que os marxistas 
revolucionários [sic] tem seu lado militar com o EI 
quando ele atacar os imperialistas e seus agentes, 
incluindo os nacionalistas curdos sírios, o peshmerga, 
o governo de Bagdá e suas milícias xiitas.” 

Abaixo a guerra dos EUA contra o EU, 31 de 
outubro de 2014. Disponível em: http://www.icl- 
fi.org/english/wv/1055/isis.html 

Em sua investida para conquistar Kobane, o Estado 
Islâmico não estava lutando contra um reduto imperialista, 
já que não havia quaisquer tropas dos EUA no terreno. O 
YPG era a única força combatendo os fundamentalistas 
com armas nas mãos em Kobane e, apesar das posições 
vacilantes de sua direção, ele não pode ser seriamente 
considerado uma “tropa terrestre” dos imperialistas. O 
YPG resistiu ao cerco do EI em Kobane por muitos meses 
mesmo antes de os imperialistas se envolverem. 

Os revolucionários devem criticar as ilusões 
propagadas por Muslim e pelo seu “agradecimento” cheio 
de ilusões à coalizão internacional. Mas o que está em 
questão para determinar que lado tomar em Kobane é 
se essas posições ou a colaboração militar tática com os 
imperialistas tomam o PYD uma força subordinada aos 
EUA em seus esforços para subjugar a Síria. 

Acreditamos que o exército americano se aproveitou 
do conflito em Kobane para bombardear o EI, mas não 
tinha a pretensão de usar o PYD, que ele ainda considera 
uma organização terrorista, como uma alavanca para 
controlar o norte da Síria. Afinal, terminada a batalha, 
os EUA não foram capazes de ter qualquer controle real 
sobre Rojava. O PYD, por sua vez, estava se beneficiando 
dos bombardeios dos EUA, mas não está integrado e 
subordinado aos esforços militares dos imperialistas na 
região. 


Portanto, a batalha por Kobane não consistiu 
em agentes dos EUA lutando contra o Estado Islâmico 
(como quer a Liga Espartaquista), mas sim uma força de 
resistência curda coordenada (mas não subordinada) com 
bombardeios americanos, lutando contra os reacionários 
fundamentalistas. Em tal luta, os revolucionários ti nh am 
um lado - com o PYD/YPG contra o EI, enquanto ao 
mesmo tempo diziam aos trabalhadores e militantes no 
Curdistão sírio a não confiar que os EUA ou o Peshmerga 
pudessem ser considerados, mesmo momentaneamente, 
seus “aliados”. 

O que essa posição demonstra é que a Liga 
Espartaquistaperdeu completamente seu senso deproporção 
(se é que tinha algum). A vitória do YPG em Rojava não é 
a mesma coisa que a vitória dos rebeldes na Líbia em 2011. 
Não se tratou de uma queda de governo orquestrada pelos 
imperialistas para colocar um fantoche em seu lugar. O 
resultado foi a manutenção no poder de um partido curdo 
com bases populares que havia subido ao poder como fruto 
da própria dinâmica da guerra civil. A resistência vitoriosa 
contra o EI foi um contraponto importante para evitar o 
avanço da reação fundamentalista. 

Por resistências proletárias em meio à guerra civil 

Diante do elemento de sectarismo religioso presente 
nas guerras que se desenrolam no Iraque e na Síria 
(envolvendo a rivalidade sunita/xiita) e o derramamento de 
sangue de ambos os lados, existe espaço para o surgimento 
de uma resistência não-sectária da classe trabalhadora 
contra esses crimes. Se acompanhada do impulso 
revolucionário de expulsar os imperialistas do Oriente 
Médio, impedir a vitória dos reacionários fundamentalistas 
e defender os curdos e outras minorias étnicas, essa posição 
tem potencial para desenvolver-se rapidamente entre os 
trabalhadores que não veem nenhuma alternativa entre os 
competidores pelo poder. 

Não existe na Síria nenhum partido de massas da 
classe trabalhadora (nem mesmo reformista) devido a 
décadas de opressão do regime de Assad sobre o país. 
A única federação sindical legalizada é inteiramente 
submetida à estrutura de Estado controlada pelo Partido 
Socialista Árabe Baath (o partido do regime). Uma 
posição de contraste com as que estão postas pela guerra 
iria imediatamente ganhar simpatia da classe trabalhadora, 
mesmo se inicialmente representada apenas por um 
grupo pequeno de quadros programaticamente sólidos 
e dedicados. Entretanto, embelezar qualquer das forças 
principais da disputa só pode levar a desastres. 

Ações de solidariedade operária sem fronteiras são 
uma pedra de toque do trotskismo e seriam essenciais para 
preparar os trabalhadores e camponeses sírios, iraquianos, 
turcos e curdos contra “suas” respectivas classes dominantes 
e as maquinações ferozes dos imperialismos. A única 
forma de assegurar uma paz de longo prazo na região é 
através de revoluções socialistas vitoriosas que ponham 
fim às rivalidades reacionárias entre clãs capitalistas 


O Globo 


32 


competidores e sua constante dependência de alianças 
traiçoeiras com os imperialistas. 

Além disso, é preciso começar o quanto antes a 
construção de um partido revolucionário dos trabalhadores 
na Síria. Junto a umprograma socialista completo de controle 
operário sobre as principais indústrias e revolução agrária 


no campo, uma organização trotskista na Síria também 
defenderia um conjunto de demandas democráticas contra 
o regime e seus adversários reacionários. Isso demonstraria 
o desejo sem compromissos dos revolucionários em 
construir uma democracia proletária, em oposição às falsas 
promessas “democráticas” dos imperialistas. -x 


Panfleto sobre a luta dos servidores estaduais do RJ 


Fevereiro de 2016 









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23 

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Este panfleto foi distribuído pelo Reagrupamento Revolucionário no massivo protesto dos trabalhadores 
estaduais do RJ no dia 2 de março (foto). Além dos trabalhadores, 0 protesto também recebeu 0 apoio de 
um grande número de estudantes secundaristas, que lutam contra a situação caótica causada pelos cortes 
na educação. Ele continua sendo utilizado nas assembleias e atos dos educadores em greve e dos servidores 
do Estado. 


Trabalhadores contra 0 governo Pezão 

Pezão está destruindo os serviços públicos do 
estado do Rio de Janeiro. A queda de arrecadação de 
royalties devido à baixa do preço do petróleo revelou 0 
rombo nas contas do estado causado pela transferência de 
dinheiro público para empresas privadas, isenções fiscais 
para os empresários, corrupção e má gestão. Os cortes das 
verbas estão deixando trabalhadores sem salário, fechando 
escolas, bibliotecas e universidades, causando um caos nos 
hospitais. O governador não hesitou em lançar também um 
“pacote de maldades” contra os trabalhadores a população. 
Ele quer 0 aumento da cobrança previdenciária dos 
servidores, congelamento de salários, restrição ou mesmo 
corte do Bilhete Único etc. Enquanto isso, segue dando 
bilhões em isenção fiscal para empresários e assumindo 
dívidas das empresas privadas, como os 39 milhões da 
conta de luz da Supervia/Odebrecht. 

Superar 0 MUSPE 

OMUSPE(quereúne somente as diretorias sindicais 


de várias categorias) chamou 0 protesto do dia 3 de fevereiro, 
que encheu a ALERJ. Isso mostra a disposição de luta dos 
servidores. Mas para derrotar Pezão será necessária uma 
luta firme, que fuja da rotina da burocracia que domina 
a maior parte desses sindicatos. É preciso brigar por 
assembleias de base em todas as categorias e preparação 
de uma greve unificada e combativa. Mas a burocracia 
sindical não está preparando essa luta. Chamou outro 
protesto só para 0 começo de março e uma paralisação de 
três dias. Se ficar só chamando um ato por mês, fazendo 
só paralisações curtas, não vai fazer nem cócegas no 
governo. Não podemos ir a reboque dessa perspectiva, que 
não almeja sequer organizar os milhares de terceirizados e 
contratados. 

É preciso unidade com os contratados e terceirizados 

E preciso unir os trabalhadores por um serviço 
público, gratuito e de qualidade, com estabilidade e plano 
de carreira digno. Para isso, não basta a demanda de mais 
concurso público, porque isso deixa de fora os milhares 





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de trabalhadores contratados e terceirizados de hoje. 
Devemos exigir, por isso, também a imediata integração 
desses trabalhadores, com igualdade de direitos. Temos 
de romper as barreiras impostas pelo governo e patrões 
para nos dividir. Mas a burocracia sindical não defende 
essa perspectiva. Inclusive o PSOL e o PSTU, que dirigem 
o SEPE, se limitam à visão de “mais concursos”. 

Nada de rotina e corporativismo 

Para essa luta ser vitoriosa, ela não pode ser 
meramente corporativa, se limitando a defender o 
pagamento dos salários atrasados. É preciso ganhar o apoio 
da população combatendo também os outros ataques de 
Pezão, questionando por inteiro a lógica de transferência de 
recursos públicos e “incentivos” às Organizações Sociais 
(OS) e outras empresas. 

Sem capitulação à polícia 

Os policiais (e setores militaristas dos bombeiros) 
reprimem as lutas dos trabalhadores. Apesar de serem 
servidores do estado, não podemos ter ilusões de que são 
“amigos” ou aliados da classe trabalhadora. A burocracia 
sindical não tem o direito de calar os servidores e ativistas 
que sabem disso e denunciam o papel cumprido pela polícia 
contra a população negra e os pobres no estado do Rio. Em 
todas as manifestações, devemos chamar também pelo fim 


da polícia militar e demais forças de repressão. Mais 
uma vez, nem a burocracia sindical e nem o PSOL/PSTU 
na direção do SEPE falam uma palavra sobre os crimes 
da polícia, por desejarem um movimento conjunto com a 
“base” dos policiais. 

Confiar em nossas próprias forças 

Não dá para ganhar essa luta apostando 
prioritariamente em apelos à Justiça ou a parlamentares. Se 
o apoio de deputados existe, deve ser explorado para 
divulgar a luta. Mas não pode ser mais do que um 
acessório. Explorar as contradições da Justiça faz parte, 
mas não substitui a luta. Através da grande maioria 
dos seus membros, tanto a Justiça como a Assembleia 
Legislativa são, em última instância, vendidas para os 
mesmos se nh ores que mandam no governo Pezão. Está 
na hora de a classe trabalhadora deixar claro que não vai 
aceitar os ataques da corja capitalista corrupta de Pezão e 
seus aliados (incluindo o governo Dilma). Mãos à obra, 
companheiros! A luta! 

- Pagamento imediato dos salários e direitos atrasados! 

- Incorporação dos contratados e terceirizados com 
igualdade de direitos! 

- Chega de privatização: por serviços 100% públicos, 
gratuitos e de qualidade! 


Coletânea Marxismo & 
Questão Negra 


Reagrupamento Revolucionário 
Livreto - 2* ed. Primeiro semestre de 2015 


Líbia e a Esquerda 


Reagrupamento Revolucionário 
Livreto ■ R-on-to ri» ?nn 


I 



FIGHT 

until KM 

YYEWIN (£. 


n zifa/tE 


■JAUJ HTHMí 

n Hapoa 


Confira também nossos livretos temáticos! Disponíveis em 
PDF em nosso site ou com um de nossos militantes. 

Acesse e confira: 

reagrupamento-rr.blogspot.com 


Coletânea Marxismo & 
Emancipação da Mulher 


Reagrupamento Revolucionário 
Livreto - Primeiro semestre de 2015 




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Guerra civil síria, Estado Islâmico e a batalha por Kobane 

Defender a Síria contra o imperialismo! Por um polo 
proletário independente! 

Por Rodolfo Kaleb, junho-julho de 2015. Atualizado e publicado em janeiro de 2016. 



Este artigo foi originalmente escrito entre junho e julho de 2015. Devido a dificuldades internas, ele não 
pôde ser publicado na época e acabou se desatualizando parcialmente devido à rapidez dos acontecimentos 
na guerra civil siria. Não obstante, ele ainda responde a uma série de questões políticas que permanecem 
centrais nesse complexo conflito e também lida com as posições problemáticas de certas organizações que 
se reivindicam trotskistas. Por conta disso, decidimos publicá-lo acrescentando alguns comentários entre 
colchetes. 


Durante os últimos anos, a população da Síria estava 
espremida entre uma ditadura de décadas, por um lado, 
e um conjunto de forças burguesas que queriam formar 
um novo regime nacional, por outro. Mais recentemente 
ela também tem se visto diante do avanço territorial dos 
fundamentalistas do Estado Islâmico e de ataques militares 
efetuados no país pelos Estados Unidos e outras potências 
imperialistas. Dedicamos esse texto a aprofundar algumas 
questões já abordadas há algum tempo, em nosso artigo 
de setembro 2012 (O Conflito Sírio e as Tarefas dos 
Revolucionários ) e a atualizar certos aspectos, levando em 
conta esses novos acontecimentos. 

Mais uma vez, frisamos aquilo que a maior parte 
da esquerda, inclusive muitos grupos que se reivindicam 
trotskistas, tem deixado de lado ao tratar da situação nesse 
país: a necessidade de uma linha de independência de 
classe diante das várias forças burguesas que no momento 
disputam 0 poder na região. Os marxistas não caem no mito 
de uma “revolução” supostamente incorporada e liderada 
pelos exércitos “rebeldes” que combatem 0 governo 
circunscritas aos interesses de frações da burguesia. Os 


rumos da guerra civil, embora não decididos mesmo depois 
de quase quatro anos, apontam a necessidade de formar um 
pólo da classe trabalhadora, oposto tanto ao governo Assad 
quanto às forças reacionárias que querem derrubá-lo para 
sua própria vantagem. De forma semelhante, 0 mesmo 
dilema da necessidade de independência de classe também 
está centralmente colocado na atual situação política em 
Kobane. 

O caráter das principais forças em disputa na Síria 

O regime Assad é um regime capitalista de partido 
único de duas décadas, que governa uma nação pobre 
confinada à ordem mundial do imperialismo. De todas as 
violações aos direitos humanos que aconteceram desde 0 
começo da guerra, a maioria veio das mãos do governo 
sírio. Ele tem como aliado internacional a Rússia, com 
quem tem acordos comerciais relevantes. Da parte da 
classe trabalhadora, porém, tal regime ditatorial não 
merece nenhum apoio político. 

Já a Coalizão Nacional Síria Continua na p 26